Chuang-Tsê, 369-286 a.C |
1) O joalheiro que Leskov encontra em Praga, o velho Wenzel, é o responsável pelo misticismo do conto - cujo título completo é precisamente "Alexandrita (Um fato natural à luz do misticismo)". Para ele, as pedras profetizam, se comunicam com os homens. Mas o que interessa especialmente é o ritual do joalheiro, seus gestos com as pedras, todo o cerimonial necessário para a manipulação das pedras. Como os sábios chineses que povoavam a mente perturbada de Kien, no Auto-de-fé de Elias Canetti, o místico Wenzel de Leskov dá suas lições com muita concisão, sem alarde, seguindo o tempo plácido da natureza.
2) "Quantas vezes não fui procurá-lo", escreve Leskov, "e o meu piropo não só não estava pronto, como Wenzel nem mesmo se ocupara dele". E mais: "o meu 'prisco príncipe' ficava jogado no prato como um 'limpa-chaminés', na companhia mais baixa e mais indigna dele". Wenzel apenas esperava, como Chuang-Tsê, o sábio chinês citado por Italo Calvino em uma de suas "propostas para o próximo milênio": para desenhar um caranguejo, Chuang-Tsê pediu ao rei cinco anos e uma casa com doze empregados. Passados cinco anos, não havia sequer começado o desenho, e pediu mais cinco anos. O rei concordou. Ao fim do décimo ano, Chuang-Tsê pegou o pincel e, num único movimento, desenhou um caranguejo, "o mais perfeito caranguejo que jamais se viu", escreve Calvino (e Chuang-Tsê é uma referência também para Roberto Calasso, como ele mesmo afirma em entrevista recente).
3) Naquele que é talvez o seu ensaio mais longo, "Nueva refutación del tiempo", Borges também menciona Chuang-Tsê: fala do famoso sonho da borboleta, no qual Chuang Tzu (essa é a grafia utilizada por Borges) "sonhou que era uma borboleta e, ao acordar, não sabia se era um homem que havia sonhado ser uma borboleta ou se era, agora, uma borboleta sonhando que era um homem". Chuang-Tsê rondava Borges há tempos - desde o início da década de 1930, quando lera o volume de Herbert Allen Giles sobre o chinês, de 1889. O sonho da borboleta já havia aparecido na antologia de literatura fantástica que Borges publicou com Bioy Casares em 1940. Retorna comentado no ensaio (publicado em duas partes, 1944 e 1946), que aparece em livro (Otras inquisiciones) em 1952. Manejando a citação como uma pedra preciosa, Borges precisou de pouco mais de dez anos para lhe uma forma final.
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