1) O velho Wenzel consegue ver na pedra uma série de conexões, de dados, fatos e histórias que ninguém mais é capaz de ver. Como o gaúcho rastreador de que fala Sarmiento no Facundo, Wenzel tem uma capacidade sobrenatural de ler o mundo, ler seus signos, seus traços, suas minúcias, e a partir delas contar uma história, construir um relato. Como o rastreador de Sarmiento, também o velho Wenzel passou o ofício aos filhos - e também ele persegue as pistas que levam a um crime esquecido pela história (até chegar, finalmente, ao assassinato do imperador).
2) "Em nossa época", escreve Leskov, "Wenzel é uma ave perdida no tempo, uma carta fora do baralho". O velho Wenzel está em descompasso com o tempo que lhe coube, ele vive o tempo das pedras, o ciclo lento e arcaico das vibrações místicas das montanhas. Para ele o tempo estará sempre out of joint, como grita o Hamlet de Shakespeare. Como se o joalheiro vivesse cindido no tempo - simultaneamente na vida dos homens e na vida das pedras.
3) O velho Wenzel, escreve Leskov, levou sua pedra para passear - a pedra preciosa que muitos dias antes Leskov lhe havia confiado para a correção da lapidação. Foram para "além da escadaria de Nusle", em Praga, "em frente da muralha de Carlos". A pedra revelou ao velho Wenzel toda sua história, desde "os priscos dias, quando não havia nascido nem Sócrates, nem Platão, nem Aristóteles, e também não tinha acontecido nem o pecado de Sodoma nem o incêndio de Sodoma". Uma característica de Leskov, notada por Benjamin em seu ensaio sobre o narrador, aqui se encontra exacerbada: a arte de narrar retira seu vigor das profundezas da natureza inanimada - que, dialeticamente, passa à vida no encontro do leitor com a escritura.
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