1) Diretamente da Budapeste de Sándor Márai, em algum ponto dos últimos anos da década de 1950 (certamente depois da revolução frustrada de 1956), chega a notícia de um batismo comunista. O responsável pelo resgate é Juan Rodolfo Wilcock, que encontrou a nota nas páginas de algum jornal italiano que já não se sabe mais o título - tudo que sobrou foi aquilo que Wilcock colocou em um dos verbetes de seu inclassificável Fatti inquietanti. A cena poderia ter acontecido em Praga e poderia muito bem ter sido relatada por Bohumil Hrabal - ou, em tom menos farsesco e mais desesperançado, por Milan Kundera.
2) Wilcock inicia o verbete com a frase “Em um jornal de Budapeste apareceu a estranha notícia...”, e conta a história do batismo de Mihály Czirjancis, filho de um operário, em uma cerimônia que “não se sabe se definir de religiosa”. A secretária da seção local do partido comunista serviu de madrinha, e os ritos foram realizados no pátio da fábrica. O pai e os colegas “cantaram em coro os diversos hinos comunistas húngaros”. Tudo aconteceu porque o pai "não se contentou com a fria burocracia dos trâmites no cartório" (Fatti inquietanti, Milão: Adelphi, 1992, p. 146).
3) Hrabal escreveu um conto que se chama justamente "O batismo" (Křtiny), incluído na coletânea Poupata, que reunia escritos de 1938 a 1952 (a tiragem foi destruída pela censura poucos dias depois da impressão, em 1970). Um padre dirige em direção à igreja e atropela uma cabra, que agoniza em um buraco. O padre estrangula o animal e destroça sua cabeça com uma pedra (aparentemente porque sentia medo). Coloca a cabra no banco de trás e segue viagem. Assusta seu assistente ao aparecer coberto de sangue e de terra. Lava-se e em seguida começa a preparar a sala para o batismo. Antes de começar, diz ao pai da criança: o batismo é um símbolo, mas não faça da sua vida um símbolo.
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