2) Nesse ponto, Saer comenta um paradoxo: as ficções que jogam com o falso (atribuições errôneas, anacronismos deliberados) não tem como objetivo confundir o leitor, e sim ampliar o registro imaginativo no confronto com o empírico, mostrando que o falso não é atributo essencial da ficção, mas elemento recorrente nas relações humanas e, portanto, elemento historicamente situado. "La paradoja propia de la ficción", escreve Saer, "reside en que, si recurre a lo falso, lo hace para aumentar su credibilidad". Os dois exemplos dados por Saer nesse momento são bem diversos: Borges e Thomas Bernhard (a escolha dos exemplos, contudo, é eloquente no que diz respeito à poética de Saer, que busca precisamente um ponto intermediário entre a concisão conceitual e filosófica de Borges e a exploração maníaca da linguagem - com seus envios e reenvios sintáticos - de Bernhard).
3) A ficção aumenta sua credibilidade ao utilizar o falso porque reconfigura, com isso, aquilo que se entende por "realidade". Os dois exemplos extremos utilizados por Saer em seguida (Soljenítsin e Eco) mostram duas situações de insuficiência desse paradigma: no primeiro, a ficção é instrumento da ideologia e a realidade é soberana (toca o sublime, embora Saer não utilize o termo); no segundo, o artifício é soberano, todas as técnicas se equivalem em uma mescla acrítica de gêneros, elementos e estratégias ("El artificio, que suplanta al arte, es exhibido continuamente de modo tal que no subsista ninguna ambigüedad", escreve Saer).
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