quinta-feira, 6 de junho de 2013

Evolução literária formalista

Charles Maturin, 1819
1) Tinianov dedica um ensaio inteiro ao problema da "evolução literária" e Ricardo Piglia realmente dá a ele os créditos da filiação "tio-sobrinho", em Respiração artificial: Alguien, un crítico ruso, el crítico ruso Iuri Tinianov, afirma que la literatura evoluciona de tío a sobrino (y no de padres a hijos) (p. 21 da edição Seix Barral). Mas Victor Erlich parece resolver a questão em seu livro Russian Formalism: History, Doctrine (Mouton, Haia, 1955, p. 260), citando o texto de Chklóvski no qual o crítico russo afirma: according to the law which, as far as I know, I was the first to formulate, in the history of art the legacy is transmitted not from father to son, but from uncle to nephew (Erlich cita de um livrinho publicado por Chklóvski em 1923, Literatura i kinematograf, já traduzido ao inglês).
2) Não há razão, contudo, para restringir a produtividade desse método somente a Chklóvski. Pois Tinianov, em seu texto sobre a evolução literária, amplia muitíssimo a questão - naquilo que pode ser considerado como uma sorte de trabalho em grupo ou criação coletiva, dado o contexto de intensa troca intelectual que lugar nas reuniões da OPOJAZ a partir e sobretudo em 1916. 
3) Oscar Wilde antecipa esse procedimento formalista de filiação alternativa com seu Retrato de Dorian Gray, que nasce em parte do fluxo que ele absorve de seu tio Charles Maturin. Nada mais adequado à poética de Wilde, que estabelece não apenas um exercício de confusão entre vida e arte, mas uma complexa estrutura de filiações alternativas e monstruosas. Nesse sentido, observa-se que em Wilde tudo corre em direção contrária ao estabelecido, ao convencional, ao moralmente determinado - desde o desejo sexual até o referencial mimético (em Dorian Gray, por exemplo, a "arte" (o quadro) ganha independência da "vida" de modo perverso e parasitário e trágico).

4 comentários:

  1. Pode ser viagem mas será que num rende fruto pensar (com essa coisa de Tios e sobrinhos) pensar a evolução literária a partir dos esquemas do parentesco do tio Lévi-Strauss? Ou até a partir das releituras que o Viveiros faz no ensaio (Filiações intensivas e alianças demoníacas). Enfim, num acho que nada esteja pronto, talvez seja só uma fagulha bem bem pequeninha (provocada pelo fato de eu estar freqeutnando esses dois). Enfim. Bom post como sempre.

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    1. Pois é, Rafa, não tinha pensado nesse possível desdobramento "estrutural", mas a coisa parece instigante - sobretudo com essa ideia de "alianças demoníacas", que faz todo sentido no caso do Wilde e também do Maturin (cujo romance é sobre venda da alma ao demônio, etc).

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  2. você pode acrescentar à lista, se me permite, a relação sobrinho-tio que está em 'extinção', do thomas bernhard. o narrador, franz-josef murau, renega insistentemente a família (sobretudo pela afiliação ao nacional-socialismo) e aprende o que sabe de arte instigado pelo tio.

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    1. É verdade, Paulo, muito bem lembrado - o romance do Bernhard é realmente todo centrado nesse afeto TIO - SOBRINHO. Obrigado pelo comentário!

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