W. J. Bate, 1918-1999 |
1) Poucos anos depois da publicação de Orientalismo, em 1978, livro no qual Said procura oferecer um relatório dos aspectos traumáticos da formação da filologia como disciplina moderna, poucos anos depois, portanto, no início da década de 1980, Paul de Man escreve o ensaio "The Return to Philology", publicado em 10 de dezembro de 1982 no Times Literary Supplement. Apesar do teor programático do título, o ensaio nasceu como uma resposta pontual de Paul de Man às considerações de Walter Jackson Bate, professor em Harvard, sobre o ensino de literatura nos Estados Unidos ("The Crisis in English Studies", Harvard Magazine, set-out. 1982).
2) Parte do trabalho da filologia está no estudo dos comentários, ou seja, o estudo da natureza e das funções dos comentários e a história das práticas de leitura revelada pelos comentários. Um texto como o Pierre Menard de Borges diz mais sobre um contexto histórico específico de comentário do que sobre o Dom Quixote em si - embora o conto de Borges seja também uma leitura de Cervantes. Os retornos de Paul de Man e Edward Said à filologia são, portanto, comentários ao campo da filologia e aos seus instrumentos, e carregam a dinâmica própria dessa "história das práticas de leitura".
3) O que Said tem mente, ao menos em parte, no andamento de Orientalismo, é a filologia das "línguas históricas" e o complexo relacionamento disso com as políticas imperialistas durante uma diacronia bastante extensa. De Man, por outro lado, reivindica domínios mais restritos - sua insistência retórica ganha ares mais concretos quando se pensa no posicionamento institucional que se buscava para o pensamento da desconstrução na época de publicação do ensaio. Jacques Derrida, em O olho da universidade, resgata o ensaio de Paul de Man e também o texto inicial de W. J. Bate, que Derrida qualifica de "ignorante" e "irracional". Já são ao menos três retornos: o retorno da filologia ao passado, seu gesto definidor; o retorno de Paul de Man à filologia; e, finalmente, o retorno de Derrida ao retorno de Paul de Man - um "retorno" que é traduzido por Derrida como "disputa", confronto entre aqueles que leem e aqueles que não leem o suficiente.
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