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2) O interrogatório tem um efeito devastador sobre a mulher - assim como acontece com a protagonista de O compromisso, de Herta Müller, que sucumbe pouco a pouco diante da insistência de um asqueroso agente da polícia. "Eu a conhecia, de vista, há muito tempo", escreve Kundera. "Era inteligente e espirituosa, muito habilidosa na arte de controlar suas emoções e sempre impecavelmente vestida". O medo, contudo, da noite para o dia, "como uma grande faca, abriu aquela mulher diante de mim". Kundera escreve que ela parecia "uma carcaça cindida", balançando no alto de um gancho de açougue.
3) De repente, diante da transformação daquela mulher, Kundera sente o desejo de machucá-la: "eu queria bater brutalmente em seu rosto e subjugá-la completamente, acolhendo todas as suas contradições: sua roupa impecável e seu estômago embrulhado, seu bom senso e seu medo, seu orgulho e sua vergonha". Kundera olha nos olhos da mulher e vê confusão, tormento: "quanto mais atormentados os olhos, mais meu desejo se tornava absurdo, estúpido, escandaloso, incompreensível, impossível de suportar". Kundera termina seu breve texto dizendo que a história lhe voltou inteira à memória no momento em que viu o tríptico de Bacon, dedicado a Henrietta Moraes. As imagens de Bacon funcionaram em dois sentidos: lembraram o desejo de violência que o próprio Kundera experimentara anos antes, ao mesmo tempo em que chegaram a ele como um gesto de violência, como se ele, ao contemplar os quadros, fosse a violência e o violentado ao mesmo tempo.
3) De repente, diante da transformação daquela mulher, Kundera sente o desejo de machucá-la: "eu queria bater brutalmente em seu rosto e subjugá-la completamente, acolhendo todas as suas contradições: sua roupa impecável e seu estômago embrulhado, seu bom senso e seu medo, seu orgulho e sua vergonha". Kundera olha nos olhos da mulher e vê confusão, tormento: "quanto mais atormentados os olhos, mais meu desejo se tornava absurdo, estúpido, escandaloso, incompreensível, impossível de suportar". Kundera termina seu breve texto dizendo que a história lhe voltou inteira à memória no momento em que viu o tríptico de Bacon, dedicado a Henrietta Moraes. As imagens de Bacon funcionaram em dois sentidos: lembraram o desejo de violência que o próprio Kundera experimentara anos antes, ao mesmo tempo em que chegaram a ele como um gesto de violência, como se ele, ao contemplar os quadros, fosse a violência e o violentado ao mesmo tempo.