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Contemplai, cidadãos da pátria Tebas,
contemplai esse Édipo famoso,
habilidoso em decifrar enigmas,
que tinha em suas mãos força e poder,
rei invejado, próspero e feliz,
mas sobre o qual acaba de abater-se
furiosa tempestade de infortúnios.
Pelo que vedes, a nenhum mortal
que ainda espera o dia derradeiro
considereis feliz,
antes que tenha atingido e transposto,
livre de qualquer desgraça,
o marco final da vida.
Sófocles. Édipo rei.
Traduzido diretamente do grego
por Domingos Paschoal Cegalla.
Difel, 2005, p. 154.
Hegel vê na tragédia antiga a marca de uma certeza: se há sofrimento, há culpa. Segundo Hegel, Édipo, mesmo não sabendo que o homem que encontrou e matou era seu pai, tomou para si a culpa e a responsabilidade - e este é o elemento heroico da tragédia, potencializado pelo fato de que Édipo é reconhecido justamente por seu saber [ele decifrou o enigma da Esfinge]. A tragédia está também no desperdício de um dom: ele não reconheceu seu pai quando esteve frente a frente com ele - o que, de certa forma, desmonta retrospectivamente toda sua fama e habilidade, contemplai esse Édipo famoso, habilidoso em decifrar enigmas. A vida póstuma de Édipo [essa sobrevivência da qual usufruo eu, e tantos outros, no comentário] está na indecidibilidade desse esvaziamento súbito, nessa mescla de vida e morte.
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