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Para Baudelaire, o espaço público não é um "lugarejo" onde ficar para se beneficiar das virtudes da vida pública. A saída de si no público apresenta-se paradoxalmente como uma ameaça, a vontade de se arrancar da solidão, aquela que encontra o camponês promovido à cidade, aquela que é o quinhão do estrangeiro ou do migrante. Sair da solidão, sair de seu interior, não oferece a garantia de se beneficiar da felicidade pública.
O espaço público é incerto, e o sujeito que ali se arrisca é indeciso; é por isso que ele se esconde por trás das máscaras. Para Baudelaire, o
flâneur pode se perder na multidão, fundir-se na turba ou então ainda se deparar com o lado noturno da vida pública, aquele em que a multidão pode fascinar, aquele em que o homem das multidões pode ter, como em Poe,
o rosto do criminoso. Mas o
flâneur também pode, fascinado que é pelos negócios, pelos símbolos e pelas passagens, consumir as mercadorias expostas nas galerias comerciais e nas avenidas. Enfim, o
flâneur pode juntar-se à multidão na esperança de mudar o espaço público; é a hipótese utópica ou revolucionária à qual os massacres de junho de 1848 em Paris e depois a queda da Comuna põem fim. Hipótese que devia alimentar, segundo Julien Gracq, o mito da cidade revolucionária até a aurora dos anos 1970. Eis
três roteiros: o da criminalidade, o do consumo burguês e o da revolução, que fazem do
flâneur um personagem hesitante entre o medo (a multidão como uma máscara do crime), a circularidade burguesa (sai-se de casa para voltar melhor, com produtos para consumir dentro dela) e a utopia revolucionária (o agrupamento de massa muda a história).
Olivier Mongin. A condição urbana - a cidade na era da globalização. Tradução de Letícia Martins de Andrade. Estação Liberdade, 2009, p. 69-70.
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