domingo, 6 de outubro de 2019

Morada

Por que, para Heidegger, o ser se conjuga com o tempo? Porque o ser não está dado desde sempre de forma essencialista; pelo contrário, o ser está em construção, em processo, em devir. Para Heidegger, a subjetividade não é o reino de um autodomínio absoluto e homogêneo - por isso a imagem do ser que é "lançado" no mundo, em um ambiente de desamparo e angústia. 

As noções de desamparo e angústia permitem relacionar o projeto de Heidegger ao de Freud. O sujeito psicanalítico é descentrado, já não é mais "senhor em sua própria casa" (como diz Freud nas Conferências introdutórias). Não por acaso, Heidegger fala da morada do ser, não por acaso valoriza tanto sua própria casa na floresta. Quando Karl Kraus fala que a psicanálise oferece a solução para um problema que ela criou acerta em cheio (ainda que contra sua intenção, que já não importa) nessa mudança de perspectiva: assim como Heidegger associa o ser ao tempo, fundando uma nova exposição de antigos problemas (a destruição da metafísica mais do que a desconstrução), Freud associa o ser à variabilidade infinita da interpretação, criando não uma "solução", mas um procedimento de produção interminável de questionamentos (acerca do ser e também do tempo). 

Nenhum comentário:

Postar um comentário