"Pensava em César Vallejo.
Sempre tive sorte com os poetas. Quer dizer: meus encontros com suas obras sempre foram oportunos. Sempre topei, no momento oportuno, com a obra poética que podia me ajudar a viver, me fazer avançar na acuidade da minha consciência do mundo. Assim com César Vallejo. Assim, mais tarde, com René Char e com Paul Celan.
Em 1942, era a poesia de César Vallejo que eu havia descoberto. Não foi nada agradável, aquele ano. Fui obrigado a largar o preparatório para a Escola Normal Superior, no Henri IV, a fim de ganhar minha vida. Minha sobrevivência, melhor dizendo: algo com que subsistir parcamente. Conseguia, a duras penas, dando aulas de espanhol a alunos de todas as idades, de latim a jovens malandros de boa família, às vezes detestáveis. Só fazia refeições de verdade dia sim, dia não, mais ou menos. Volta e meia me alimentava com bolinhos de trigo-sarraceno comprados sem tíquete de racionamento numa padaria que havia na época no bulevar Saint-Michel, no lugar onde se encontram as ruas Racine e Ecole-de-Médecine.
Mas havia descoberto a poesia de César Vallejo.
Me gusta la vida enormemente
pero, desde luego,
con mi muerte querida y mi café
y viendo los castaños frondosos de París..."
(Jorge Semprun, A escrita ou a vida, tradução de Rosa Freire d'Aguiar, Cia das Letras, 1995, p. 165)
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