1) Muitos dos romances de Joseph Roth são semelhantes na forma: capítulos breves organizados dentro de seções mais amplas. Rebelião, por exemplo, de 1924, tem dezenove capítulos; Direita e esquerda (Rechts und Links), de 1929, um pouco maior, tem vinte capítulos, divididos em três seções. Os dois romances também repetem um procedimento recorrente em Roth: o aparecimento de um personagem, lá pelo meio da narrativa, que irrompe abruptamente e desvia a rota até então estabelecida para o protagonista ou protagonistas.
2) No caso de Rebelião, o corte acontece com o surgimento do burguês no bonde, que faz comentários raivosos acerca de Andreas Pum, o inválido de guerra sem uma perna que também está no bonde. No caso de Direita e esquerda, acompanhamos a história de Paul Bernheim, filho de um banqueiro que desde a infância está destinado ao sucesso - é bonito, refinado, agrada às mulheres e aos homens, vai estudar na Inglaterra, domina a conversação civilizada dos salões em uma variedade de assuntos, etc. Até o momento em que surge Nikolai Brandeis, um homem mais velho, de pele morena, muito alto e distinto, riquíssimo e vindo do Leste depois da Primeira Guerra Mundial. Ao contrário do burguês de Rebelião, que surge no meio da narrativa e some (deixando apenas os efeitos de sua intervenção sobre o destino de Andreas Pum), Brandeis surge e permanece, esquivo a princípio, mas aos poucos dando indícios de suas origens e passado.
3) "Eu ainda consigo lembrar o tempo em que Paul Bernheim prometia se tornar um gênio", é a primeira frase de Direita e esquerda, anunciada por um "eu" que não vai mais se manifestar (como se o romance tomasse lugar inteiramente na dimensão aberta por esse eu me lembro). Além disso, a narrativa se articula a partir dessa expectativa da genialidade de Paul Bernheim e sua manifestação duvidosa na vida futura. Eis outro tema forte em Joseph Roth: a articulação entre passado e futuro, entre expectativa e projeção (em outras palavras, o tema do messianismo, que vai ocupar, nos mesmo anos, Kafka, Walter Benjamin, Scholem e, mais adiante, Agamben, Sebald). Tal construção será utilizada novamente por Roth poucos anos depois em seu romance Jó, de 1930 (um ano depois de Direita e esquerda, portanto), mas invertida: Paul Bernheim gera uma expectativa alta que é esvaziada com o passar da narrativa; Menuchim, por sua vez, o último filho de Mendel Singer, protagonista de Jó, nasce deformado, epilético e retardado - mas carrega consigo a profecia de um rabino: tudo vai passar, "e como ele haverá poucos em Israel".
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