quarta-feira, 10 de fevereiro de 2010

A literatura norte-americana

1- Ricardo Piglia costumava dizer em entrevistas que a literatura norte-americana era a literatura universal em um único idioma – talvez porque reúna vertentes estilísticas e pertencimentos culturais os mais diversos.

2- Paul Auster dedica Leviatã, seu melhor livro, a Don DeLillo.

3- Nicanor Parra diz que os EUA é o único país onde a liberdade é uma estátua.

4- Auster está próximo de Philip Roth em alguns momentos de idealização da natureza – leitores empenhados de Thoreau e Walt Whitman.

5- Roth foi mais longe: efetivamente se recolheu em uma propriedade isolada no interior.

6- Mas só para ver que a loucura comunitária também estava lá: a agência postal que explode na Pastoral americana, a vergonha que acompanha o retiro do professor em A marca humana.

7- Cultura pop, II Guerra, Guerra do Golfo: temas para Roth, DeLillo, Pynchon, mas Auster fica de fora.

8- Submundo é o grande livro sobre o baseball; O paraíso é bem bacana é o temos sobre o futebol.

9- O primeiro segue a bola, como uma relíquia que capitaliza o tempo e transforma a devoção em mercadoria; o segundo segue um maluco, um Messias de plástico de pouca serventia.

10- A tradição Argentina aglutina: transforma o corpo em relíquia (Evita embalsamada, a mão de Perón e o cadáver de Arlt sobre a cidade).

11- A especificidade norte-americana está na forma ou no estilo?

12- Lolita: um monomaníaco profundamente norte-americano em um estilo completamente estrangeiro.

13- Onde há mais Faulkner: Saer ou McCarthy?

14- Roth ouviu Thomas Mann falar na década de 50, quando estava na universidade em Chicago.

15- O que fica de Cosmópolis, O arco-íris da gravidade e O complexo de Portnoy é o estilo, reverberando no ouvido anos a fio; o que fica de Fogo pálido, Submundo e O avesso da vida é a forma, concatenação, estrutura e inventividade da montagem.

16- Forma e estilo: Enquanto agonizo, Palmeiras selvagens e Meridiano sangrento.

17- Roth casou com uma britânica, Auster com uma escandinava, a mulher de Safran Foer escreve muito melhor que ele, DeLillo trabalhou com publicidade e Gore Vidal é gay.

18- Portnoy tem um glossário de termos judaicos; Vineland tem um glossário de termos televisivos; Libra tem um glossário de termos de espionagem.

19- Lolita escrito por Faulkner: sempre o mesmo vestido, pés descalços, Lolita grávida e sem goma de mascar.

20- Lolita escrito por Don DeLillo: constante cobertura televisiva e fotos de Humbert Humbert nu vendidas a uma revista.

21- Libra escrito por Nabokov: em Moscou, Lee Harvey Oswald descobriria seu destino nas linhas de um poeta simbolista russo, lentamente traduzido no porão de um paiol abandonado.

22- J.M. Coetzee foi preso e expulso dos EUA por causa da Guerra do Vietnã; Giorgio Agamben recusou um cargo na Universidade de Nova Iorque por causa da guerra no Iraque.

23- Terrorista (Updike) é uma tentativa mal-sucedida de inserir a realidade na ficção; Leviatã (Auster) é uma tentativa bem-sucedida de inserir a ficção na realidade.

24- André Breton fez questão de somente falar francês, e de não aprender nenhuma palavra em inglês, na breve estada que desfrutou em Nova Iorque, século passado.

25- “América, 1944: lugar de alucinações febris, sobretudo para os refugiados de língua alemã, expostos ao primeiro e brutal contato com a sociedade industrial pura, muitas vezes com arrepios e recusas diante da ‘mecanização do espírito’. Naquele período, em grande quantidade, houve suicídios e desoladas solidões em apartamentos minúsculos de Nova York ou de Los Angeles. Muitos não resistiram, tornaram-se fantasmas patéticos da velha Europa, restos de uma cultura que ninguém mais tinha vontade de usar.” Roberto Calasso, Os 49 degraus, p. 125.

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