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Uma passagem muito interessante no meio da confusão que é Sexus, de Henry Miller: Mona, a nova mulher do narrador-protagonista (que larga mulher e filha para viver este novo grande amor), questionada por este acerca de seus sonhos, demora em responder; em realidade demora dias para responder com algum relato específico de sonho. Ela diz, primeiro, que simplesmente não sonha. Dias depois, Henry nos diz que ela apareceu com relatos curiosos de seus sonhos, histórias sem pé nem cabeça, o que lhe dá certa alegria, já que agora podem conversar sobre esse tópico tão importante para um escritor que são os sonhos.
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Miller guarda esse frescor que não encontramos mais do escritor que acredita no processo inconsciente da escritura, das coisas que afloram quando menos se espera e do dia que se desenrola tendo como único propósito a descoberta desse momento - a partir disso o sujeito, então, fica a vagar e a pedir dinheiro emprestado aos outros, fazendo pouco caso do que dizem ou fazem.
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Folheando os livros da biblioteca da casa onde estão hospedados (Mona e Miller), Henry encontra livros médicos, livros de psicologia, livros com relatos de casos clínicos e coisas diversas nessa linha, com papéis marcando páginas específicas, papéis marcando justamente os relatos de sonhos que fazem parte das análises dos casos clínicos. Henry reconhece os sonhos de Mona - melhor ainda: reconhece partes dos sonhos, muitos trechos de muitos relatos formando um único sonho de Mona. Mona montou seu próprios sonhos a partir dos textos que leu, Mona ficcionalizou o próprio inconsciente a partir dos textos que leu.
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