1) Relendo París no se acaba nunca, de Enrique Vila-Matas, reencontro a passagem na qual o narrador lê o livro de Edgardo Cozarinsky, Vodu urbano. A leitura que faz Vila-Matas desse livro específico de Cozarinsky só vai acontecer mais tarde, na década de 1980 - pois o curso temporal padrão de París no se acaba nunca corresponde aos dois anos (1974-1976) que o narrador de Vila-Matas mora em Paris. Nesse período ele também lê Cozarinsky, o livro sobre o chiste e seus ensaios sobre Borges e o cinema.
2) Retrospectivamente, porém, escreve o narrador de Vila-Matas, Vodu urbano ilumina e esclarece certos procedimentos que circulavam no ar da década de 1970 mas que não eram definíveis ou definidos. "Cozarinsky parece ter levado bastante a sério", escreve Vila-Matas, "aquilo que dizia Godard sobre fazer filmes de ficção que fossem documentais e documentários que fosse como filmes de ficção. Vodu urbano parecia composto de narrações que eram como ensaios e ensaios que eram como narrações".
3) Vila-Matas defende a ideia que tanto ele quanto Cozarinsky beberam da mesma fonte, que é Godard (e também Borges, considerando outras seções de París no se acaba nunca nas quais Cozarinsky é associado a ele). A ideia do original que se arma a partir de um arranjo de citações, a própria noção do original como ficção de base, como irônico ponto de passagem em direção ao literário pensado como artefato a ser utilizado, e não essência a ser moldada. O que é interessante de observar é essa rápida cartografia que Vila-Matas apresenta em París, que fica um pouco obscurecida pelo tom rápido e despreocupado das memórias de Paris (ou seja, a cartografia que aproxima Godard de Borges e posiciona Cozarinsky como disseminador dessa "poética estrábica", como fala Alan Pauls em El factor Borges).
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