terça-feira, 17 de abril de 2018

A máquina de escrever

Sam Messer
Quando um escritor recorre a uma língua diversa de sua língua materna, ele o faz por necessidade, como Conrad, ou devido a uma ambição ardorosa, como Nabokov, ou ainda para obter um maior distanciamento, como Beckett. Pertencendo a uma estirpe diferente, no verão de 1977, em Nova York, depois de viver cinco anos neste país, entrei numa pequena loja de máquinas de escrever da Sexta Avenida e comprei uma Lettera 22 portátil, passando a escrever (ensaios, traduções, ocasionalmente um poema) em inglês por uma razão que tinha muito pouco a ver com as mencionadas acima. Minha única finalidade na época, como continua a ser agora, era me sentir mais próximo do homem que considero a maior inteligência do século XX: Wystan Hugh Auden.

(Joseph Brodsky, Menos que um, trad. Sergio Flaksman. Cia das Letras, 1994, p. 129).

*

Três anos e meio depois, voltei para a América. Era julho de 1974, e quando desfiz as malas naquela primeira tarde em Nova York descobri que minha pequena máquina de escrever Hermes tinha sido destruída. A caixa estava quebrada, as teclas estavam retorcidas e não havia esperança de reparo. Eu não podia comprar uma nova. Estava particularmente duro naquela época. Algumas noites depois, jantando com um ex-colega de faculdade, contei a história da destruição da minha máquina de escrever. Ele disse que tinha uma no armário que não usava mais, que havia ganhado de presente de formatura do colégio em 1962. Se eu quisesse comprá-la, ele disse, ele ficaria feliz em vendê-la para mim. Concordamos com o preço de 40 dólares. Era uma Olympia portátil, fabricada na Alemanha Ocidental. Esse país não existe mais, mas desde aquele dia em 1974 cada palavra que escrevi foi datilografada naquela máquina.

(Paul Auster, "The Story of My Typewriter" (julho de 2000), Collected Prose. Picador, 2003, p. 291).

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