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2) A composição da novela mostra o senso de humor do Tempo por uma série de razões: 1) Bolaño desloca a ação para a Paris de fins da década de 1930 [esse é também o primeiro gesto de saída da área de conforto], focando as manifestações tardias de uma prática terapêutica conhecida como o "mesmerismo"; 2) A epígrafe do livro vem de um conto de Poe chamado "Revelação mesmérica", escrito quase 100 anos antes da época em que se passa Monsieur Pain; 3) Paris, em 1938, acumulava uma série de fluxos vanguardistas: os mesmeristas tardios estavam em contato com surrealistas tardios e dadaístas tardios, e todos esses também em contato com discípulos de Marie Bonaparte [a psicanalista formada e analisada por Freud, uma das difusoras da psicanálise na França], discípulos de Pétain, discípulos de Marcel Mauss [discípulo e sobrinho de Durkheim], discípulos de Marx, discípulos de Napoleão, entre outros; 4) Todas essas confluências se complicam quando Bolaño coloca o poeta peruano César Vallejo na história, que efetivamente morou em Paris, adoeceu, consultou mesmeristas e lá também morreu.
3) Monsieur Pain, dessa forma, aglomera uma porção de tempos: revisita a vida complicada de Vallejo no exílio e, de forma oblíqua, a própria poética vanguardista latino-americana da época [Vallejo, em Monsieur Pain, é também uma espécie de Lautréamont tardio, uma espécie de duplo daquele Lautréamont que Cortázar transformou em personagem no primoroso conto "O outro céu"], especialmente sua tensa e fecunda relação com a Europa. Outra sobreposição interessante: Bolaño arma sua história a partir de duas facetas de Poe, que em Monsieur Pain estão unidas: a preocupação com os estados "subterrâneos" da mente e suas histórias policiais [porque MP também é um romance noir]. Assunto para uma próxima vez: pensar Monsieur Pain como uma reescrita latino-americana de Monsieur Teste, de Paul Valéry [com todos os agravantes que a aproximação de Teste e Pierre Menard pode trazer (e Valéry traz também a aproximação entre Baudelaire e Poe)].
3) Monsieur Pain, dessa forma, aglomera uma porção de tempos: revisita a vida complicada de Vallejo no exílio e, de forma oblíqua, a própria poética vanguardista latino-americana da época [Vallejo, em Monsieur Pain, é também uma espécie de Lautréamont tardio, uma espécie de duplo daquele Lautréamont que Cortázar transformou em personagem no primoroso conto "O outro céu"], especialmente sua tensa e fecunda relação com a Europa. Outra sobreposição interessante: Bolaño arma sua história a partir de duas facetas de Poe, que em Monsieur Pain estão unidas: a preocupação com os estados "subterrâneos" da mente e suas histórias policiais [porque MP também é um romance noir]. Assunto para uma próxima vez: pensar Monsieur Pain como uma reescrita latino-americana de Monsieur Teste, de Paul Valéry [com todos os agravantes que a aproximação de Teste e Pierre Menard pode trazer (e Valéry traz também a aproximação entre Baudelaire e Poe)].
Sabe, Kelvin. Você tá ficando mais velho, e segue voraz - leitor e escritor voraz. Mas como as coisas começam a ter maior distância a percorrer a cada redação, como os temas estão ficando maiores, tenho a sensação de que está começando a doer de verdade, ou que no mínimo está faltando ar na hora de escrever. Não preciso dizer que, um tanto quanto sádico, gosto cada vez mais do que está fazendo. Tem suor aí.
ResponderExcluirVc tem toda razão: é cada vez mais difícil encontrar a medida do que dizer e do que elidir, e é justamente nessa articulação que está toda graça de escrever o que quer que seja. Mas não fácil. E eu não tenho, nem de longe, todo o tempo que gostaria.
ResponderExcluirEstava em dúvida se adquiria esse novo Bolaño, por já estar meio que exausto do autor. Mas assim que acabar de digitar isso aqui, correrei lá no site da LC para encomendar o volume. Tenho aqui duas resenhas de Bolaño, caso te interesse:
ResponderExcluirhttp://charllescampos.blogspot.com/2010/11/estrela-distante-de-roberto-bolano.html
e
http://charllescampos.blogspot.com/2010/09/2666.html