2) Vico busca em Homero, continua Burke, a "massa de informação sobre a sociedade grega da idade heroica", como combatiam, festejavam, reuniam assembleias... "Os poemas homéricos também revelam um modo de pensar próprio da idade heroica, um modo de pensar de que o poeta não podia ter consciência - pois a falta de autoconsciência é uma das principais características desse modo de pensar". Em seu texto sobre o escritor argentino e a tradição, Borges fala que o autor do Corão, seguro de sua condição de árabe, não menciona a palavra camelo. A legitimidade do Corão está em sua feição enviesada, oblíqua: o camelo está ausente não por ser banal aos árabes, mas por ser esteticamente desnecessário, e mais: por ser esteticamente perigoso, podendo dar uma dimensão postiça a um texto que se pretende eterno.
3) A leitura nas "entrelinhas" de Vico é um dos elementos de base para a leitura dos "sinais" reveladores de Carlo Ginzburg, sua reivindicação do "paradigma indiciário". Em outubro de 2020, Ginzburg dá o título de Rivelazioni involontarie. Leggere la storia contropelo para sua aula inaugural na Università di Padova, uma fórmula que não só retoma o dito de Manzoni sobre Vico ("revelações involuntárias") como o encaixa na reflexão de Benjamin (a "história a contrapelo" das teses). O livro mais recente de Ginzburg, La lettera uccide, lançado pela Adelphi em outubro de 2021, além de incorporar a aula de Padova, deixa claro que se trata, mais uma vez, de estabelecer um método de leitura dos detalhes: na introdução do livro, Ginzburg afirma que ao longo do tempo se dedicou ao "close reading de casos anômalos, distantes de qualquer cânone".
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