domingo, 7 de novembro de 2021

O pioneiro


"A Autobiografia [de Vico] é um registro interessante e dinâmico da vida de um homem completamente voltado para as questões filosóficas. (...) Ele viveu em uma pobreza amarga, teve pouco contato com a vida que o rodeava e, durante toda a sua existência, como resultado de uma queda sofrida na infância, foi um aleijado. Seu filho mais velho foi um criminoso; toda sua devoção foi dedicada a seu filho mais jovem, para o qual conseguiu assegurar a sucessão de sua cadeira de professor. Depois deste filho, o que mais amava era sua biblioteca. Da mesma forma que Maquiavel, ele escapava das suas misérias refugiando-se no mundo dos livros (...). Toda a sua vida careceu daquilo que é mais caro para um sábio, calma e tranquilidade. Era um sábio tímido, obsequioso e perseguido pela pobreza e ansiedade, que escreveu demais e depressa" (p. 25).

"A história, para Vico, era a progressão ordenada (guiada pela Providência atuante através das capacidades dos homens) de tipos sempre mais profundos de compreensão do mundo, de formas de sentir, atuar e expressar-se, cada uma das quais se desenvolve a partir da anterior, à qual substitui. A cada tipo ou cultura pertencem, necessariamente, algumas características que não é possível encontrar em qualquer outra. Assim começa a concepção da 'fenomenologia' da experiência e atividade humana, da história dos homens e da vida, conforme determinada pela sua própria moldagem, no início inconsciente e, a seguir, progressivamente mais consciente, ou seja, pelo domínio da natureza tanto morta como viva. Na forma que lhe deram Marx, Hegel e os seus seguidores, esta ideia domina o mundo moderno, e é por isso que Marx elogiava Vico. Para melhor ou para pior, ele foi o pioneiro desta visão dos homens e da história" (p. 45).

(Isaiah Berlin, Vico e Herder, trad. Juan Sobrinho, Ed. UnB, 1982)

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