"...des Esseintes detinha-se mais amiúde diante de outros quadros que ornavam o aposento. Estes estavam assinados: Odilon Redon.
Encerravam, em suas molduras de pereira bruta debruada de ouro, inconcebíveis aparições: uma cabeça de estilo merovíngio pousada sobre uma taça; um homem barbudo, com ares a um só tempo de bonzo e de orador de comício, tocando com o dedo uma colossal bala de canhão; uma aranha assustadora que alojava no meio do corpo uma face humana. Esses desenhos excediam a tudo quanto se possa imaginar; em sua maior parte, ultrapassavam as fronteiras da pintura e inovavam um fantástico muito especial, o fantástico da doença e do delírio.
Tomado de um indefinível mal-estar diante desses desenhos, tanto quanto como diante de certos Provérbios de Goya, que eles faziam lembrar; ou como ao sair de uma leitura de Edgar Poe, cujas miragens de alucinação e cujos efeitos terroríficos Odilon Redon parecia ter transposto numa arte diferente, des Esseintes esfregava os olhos e contemplava um figura radiante que, em meio a essas lâminas agitadas, erguia-se serena e calma, uma figura da Melancolia sentada ante o disco do sol, sobre os rochedos, numa atitude acabrunhada e sombria." (J.-K. Huysmans. Às avessas. Trad. José Paulo Paes. Cia das Letras, 1987, p. 93-95).
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