domingo, 9 de outubro de 2011

Dez razões para escrever

"Como escrever não é uma atividade normativa nem científica, não posso dizer por que nem para que se escreve. Posso apenas enumerar as razões pelas quais imagino escrever:
1) por necessidade de prazer que, como se sabe, não deixa de ter alguma relação com o encantamento erótico;
2) porque a escrita descentra a fala, o indivíduo, a pessoa, realiza um trabalho cuja origem é indiscernível;
3) para pôr em prática um "dom", satisfazer uma atividade instintiva, marcar uma diferença;
4) para ser reconhecido, gratificado, amado, contestado, constatado;
5) para cumprir tarefas ideológicas ou contra-ideológicas;
6) para obedecer às injunções de uma tipologia secreta, de uma distribuição guerreira, de uma avaliação permanente;
7) para satisfazer amigos, irritar inimigos;
8) para contribuir para fissurar o sistema simbólico de nossa sociedade;
9) para produzir sentidos novos, ou seja, forças novas, apoderar-me das coisas de um modo novo, abalar e modificar a subjugação dos sentidos;
10) finalmente, como resultado da multiplicidade e da contradição deliberadas dessas razões, para burlar a ideia, o ídolo, o fetiche da Determinação Única, da Causa (causalidade e "boa causa") e credenciar assim o valor superior de uma atividade pluralista, sem causalidade, finalidade nem generalidade, como o é o próprio texto."
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Roland Barthes, Corriere della sera, 29 de maio de 1969, publicado em italiano com o título Dieci ragioni per scrivere. In: Barthes, Inéditos, vol. 1, teoria. Martins Fontes, 2004, Tradução de Ivone Benedetti, p. 101-102.

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