segunda-feira, 11 de dezembro de 2023

O material romanesco


Existe um fio subterrâneo e invisível que liga dois escritores aparentemente distantes, pertencentes a mundos muito distintos: David Markson e Milan Kundera me parecem muito próximos em certa confiança na condição inesgotável da forma romanesca. Aquilo que Kundera tem de cosmopolita e multilíngue, Markson tem de estadunidense, não apenas no que diz respeito à circunscrição específica do inglês, mas também à ligação de Markson a uma cena vanguardista que o aproxima de autores como Barthelme e Pynchon. Ainda assim, Markson e Kundera se aproximam pela via da confiança que compartilham com relação às possibilidades do romance: Kundera a partir de Cervantes e Broch, Markson a partir de Wittgenstein. 

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Até que ponto pode ser levado o material romanesco? Até que o ponto o material romanesco pode ser identificado como tal pelo leitor? Essas são algumas das perguntas que podem surgir a partir da leitura dos romances de Markson, marcados por uma rarefação impressionante de elementos como narrador e trama. Kundera, por sua vez, interfere no discurso romanesco a partir do discurso filosófico, e vice-versa. Um movimento de oscilação que é tornado possível pela interferência, na obra de Kundera, do discurso ensaístico, que funciona como uma ferramenta de costura dos outros dois. 

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