terça-feira, 3 de janeiro de 2023

Alejandra


1) Em seu livro sobre Alejandra Pizarnik, El testigo lúcido (Beatriz Viterbo, 2003), Maria Negroni cita um breve poema escrito antes de 1956, intitulado "Sólo un nombre" e publicado em La última inocencia:

alejandra alejandra

debajo estoy yo

alejandra

Negroni comenta que se trata de uma miniatura que contém e antecipa tudo, a inscrição de um "paradigma vertical" dentro do qual competem "escritura e corpo", "realidade e representação"; um aleph, em suma, que condensa todo o projeto de Pizarnik de "corrosão" da relação "entre palavra e coisa" (p. 59).

2) Debaixo de tudo está o nome próprio, a "identidade" estranhada, Das Unheimliche primordial (o verdadeiro nome de Alejandra Pizarnik era Flora; Alejandra foi uma criação da adolescência: quando César Aira escreve sobre a obra de Pizarnik enfatiza o corte do nome próprio como estratégia de "auto-modelagem", um abandono que funda a sua presença artística na "tradição"). Negroni comenta ainda que a repetição do nome "inventado" é o eco da impossibilidade inerente à linguagem e à literatura, que circulam ao redor de um vazio que se anuncia, se percebe, mas que nunca se faz totalmente presente (ou mesmo possível).

3) Para Negroni, o breve poema de Pizarnik mostra uma "dança fatídica" entre "o reprimido e o possível", "condição de toda palavra humana". Cita o Agamben de A linguagem e a morte, o momento no qual ele escreve acerca da "negatividade inerente" à linguagem: "Como o animal conserva a verdade das coisas sensíveis devorando-as, ou seja, reconhecendo-as como nada, assim a linguagem custodia o indizível dizendo-o" (p. 60). Não há narração que não edifique uma "muralha", complementa Negroni; dentro, no "espaço verbal", há sempre um "interior inacessível" (a "Arte", com seu "Minotauro" particular). 

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