segunda-feira, 23 de dezembro de 2019

Ciocchini, 1

Proponho o resgate de um ensaio que Ciocchini publica em 1966, no âmbito do Instituto de Humanidades da Universidad Nacional del Sur, especificamente no âmbito dos “Cuadernos del Sur”. O ensaio, “Hacia un humanismo contemporáneo, Saint-Exupéry, René Char”, marca ao menos dois eventos: o retorno do pesquisador argentino a Bahía Blanca depois de seu período como visitante no Instituto Warburg e, finalmente, a cristalização de uma série de apontamentos (realizados nesse período anterior que se encerra) que Ciocchini prepara na década de 1960 em torno às obras de Antoine de Saint-Exupéry e René Char. 

Na edição de número 22 da revista L'arc, de 1963, Héctor Ciocchini publica em francês um texto intitulado “La parole habitable”, dedicado ao poeta René Char, que era o foco do dossiê temático dessa edição da revista (que contou também com um texto de Maurice Blanchot, “René Char et la pensée du neutre”). Os dossiês temáticos eram comuns em L'arc (sobre Queneau (nº 28), sobre Bataille (32), Fellini (45), Duchamp (59), Cortázar (80), Henry Miller (97)), cujo primeiro número saiu em janeiro de 1958 e o centésimo (e último) em janeiro de 1986, editada por Stephane Cordier em Aix-en-Provence (6, rue Ancienne Madeleine). Trata-se, portanto, de uma produção de Ciocchini do período em que estava atuando no Instituto Warburg. Um trabalho sobre as relações entre o pesquisador argentino e o poeta René Char ainda está por ser feito (os dois se tornaram amigos a partir de uma intensa troca de cartas justamente nos inícios da década de 1960, um contato que só foi interrompido com a morte de Char, em 1988; trocavam poemas, recortes de jornal, revistas, indicações bibliográficas).

O longo ensaio de Ciocchini se organiza a partir da montagem de fragmentos, de breves seções que tocam pontos diversos das poéticas tanto de Saint-Exupéry quanto de René Char. Mais do que isso, cada seção ensaia também uma dinâmica diversa e uma intensificação própria da articulação entre os dois autores e a articulação mais ampla que propõe Ciocchini entre a literatura contemporânea e os motivos clássicos que sobrevivem. São exatamente catorze fragmentos presentes na composição do ensaio, intitulados, respectivamente, “O hiato”, “O desejo de comunicação”, “O poema do esforço”, “O ser itinerante”, “Caminhante e alpinista”, “Em direção a um tipo de homem”, “A cidade pessoal”, “Teoria da linguagem e arte do governo”, “O mito humano e as leis da vida”, “A vida anterior”, “Saint-Exupéry e a Cabala”, “Linguagem”, “Estilo” e, finalmente, “O geômetra”. “Mais do que colocar-me como crítico de Saint-Exupéry ou René Char”, escreve Ciocchini na introdução ao ensaio, “pretendi aproximar, a partir de uma ordenação e de rubricas, a obra desses autores a uma juventude que vejo necessitar a organização de sua angústia”, e “minha tarefa”, continua Ciocchini, “pode ter sido encontrar as 'linhas de força' que na obra desses autores foram eminentemente úteis para minha experiência pessoal, pensando que podem ter uma refração mais funda e saudável naqueles que abrem as páginas deste livro” (CIOCCHINI, Héctor. “Hacia un humanismo contemporáneo, Saint-Exupéry, René Char”. El sendero y los días, 1973, p. 8). 

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