Comentei dias atrás o resgate que faz Didi-Huberman de Joyce e do Ulisses, algo que se realiza sob o signo da teoria da história de Benjamin. Benjamin escreveu suas Teses sobre o conceito de história em 1940, antes de fugir da França para a Espanha. Ele enviou por carta uma cópia do ensaio para Hannah Arendt, que por sua vez enviou para Adorno que, em 1942, publicou o texto pela primeira vez (um brochura mimeografada nos Estados Unidos, via Instituto de Pesquisa Social - além do ensaio de Benjamin, o volume, Walter Benjamin zum Gedächtnis, trazia dois ensaios de Horkheimer e um de Adorno). Em 1947, sai a tradução do ensaio de Benjamin feita por Pierre Missac para o francês (na revista Temps Modernes). Adorno publica novamente o ensaio em 1950, na Alemanha, na revista Neue Rundschau; e de novo em 1955, quando edita a primeira coletânea de ensaios de Benjamin; e finalmente em 1974, com o início da publicação das obras completas (em 1981, Agamben descobre material inédito de Benjamin nos arquivos de Bataille na Biblioteca Nacional de Paris - material que permite reconfigurar a forma e o conteúdo do ensaio sobre o conceito de história).
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Num desses acasos de biblioteca, folheando livros próximos ao livro de Benjamin que estava consultando (a estratégia de Warburg da "lei da boa vizinhança", Gesetz der guten Nachbarschaft, ou seja, a organização da biblioteca que não leva em consideração prioritariamente a primeira letra do sobrenome ou mesmo divisões disciplinares, mas certas "afinidades eletivas" entre os livros), mais especificamente o livro Imperium, de Ryszard Kapuscinski (um livro-reportagem sobre a Rússia, que na minha estante vive próximo do Diário de Moscou, de Benjamin, e também de Viagem à Rússia, de Joseph Roth), e abrindo as primeiras páginas do livro de Kapuscinski achei uma frase de Simone Weil, uma das epígrafes do livro:
O presente é algo que nos une. O futuro criamos em nossa imaginação. Somente o passado é pura realidade.
Ainda com as palavras de Benjamin na cabeça, a frase de Weil me pareceu benjaminiana, me pareceu compartilhar certa Stimmung dos anos da guerra (Weil morre três anos depois de Benjamin, em 1943). Descobri que a frase vem de seus Cadernos, de suas anotações esparsas justamente do período 1940-1942 - é uma frase contemporânea, portanto, das teses de Benjamin. No original, Weil escreve:
Le présent, nous y sommes attachés. L'avenir, nous le fabriquons dans notre imagination. Seul le passé, quand nous ne le refabriquons pas, est réalité pure. (Cahiers, III (1940-1942), Paris: Plon, 1974, p. 38).
Oi, Kelvin. Muito interessante seu relato, tenho enorme interesse em explorar as afinidades (eletivas) entre os dois, Weil e Benjamin. Fico feliz em ver mais pessoas confirmarem ressonâncias entre eles. Intriga à mim a coexistência dessa proximidade com a distância que Simone Weil toma do judaísmo. Se tiver algo que você saiba sobre isso e, de algum modo, possa me indicar para conhecer, vai me ajudar muito. Acabo de conhecer o seu trabalho, Kelvin, acessei essa página pesquisando pelo nome do Pierre Missac.
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