1) Na sua Introdução à tragédia de Sófocles, Nietzsche investiga não apenas o confronto entre um passado dionisíaco, do improviso e do delírio, e um "presente" apolíneo representado pelos três grandes trágicos, Ésquilo, Sófocles e Eurípides, mas também o confronto mais amplo e decisivo entre a filologia de sua própria época (1870, mas o século XIX em geral) e aquela dos alexandrinos (responsáveis em grande medida pelo estabelecimento dos textos da antiguidade com os quais Nietzsche lida). Escreve Nietzsche:
Quando é expressamente indicado nos escólios que isso ou aquilo foi introduzido pelos que representavam, tal se refere a inserções entre o tempo do exemplar e sua utilização em Alexandria. Nos escólios, muitas rejeições: por motivos estéticos ou linguísticos. Não havia meio algo de controle incondicional. Em outra ocasião, dito com segurança: esta é a interpolação do ator. Não existia em Alexandria o critério da crítica, mas um critério dos palaiótera ("os mais antigos"). Assim, não se deveria ter esperança de poder restabelecer o original: o ponto de vista alexandrino está, todavia, ao nosso alcance, como também acontece com Homero. (p. 59).
Logo depois da menção a Homero, o tradutor Marcos Fernandes acrescenta em nota: "Nietzsche indica aqui que, também com respeito à autenticidade, encadeamento etc, dos poemas homéricos, o máximo que podemos alcançar, em nossa época, é o ponto de vista dos eruditos de Alexandria, tal como acontece com os trágicos".
2) Em Prolegomena ad Homerum, de 1795, F. A. Wolf demonstra que as obras de Homero circularam originalmente mais como canções do que como textos escritos fixos. "Após terem sofrido múltiplas mudanças na transmissão oral", escreve Anthony Grafton, "passaram por remodelação e interpolação na Atenas dos séculos VI e V a.C. Os mesmos estadistas atenienses que ordenaram a fixação dos textos na forma escrita também lhes acrescentaram versos com objetivos políticos. Mais tarde ainda, os poemas épicos foram remodelados de modo mais radical pelos primeiros eruditos profissionais da história ocidental, os frequentadores do Museu na cidade grega helenizada de Alexandria. Esses homens haviam tentado não estabelecer os textos originais escritos por Homero, mas adequar os poemas épicos herdados aos seus próprios padrões mais modernos no que diz respeito à estética e à ética" (Grafton, As origens trágicas da erudição, trad. Enid Abreu, Papirus, 1998, p. 78).
3) Grafton, na mesma página, cita um trecho do tratado de Wolf: "O Homero que temos em nossas mãos agora não é o que floresceu nas vozes dos gregos de sua própria época, mas uma versão alterada, interpolada, corrigida e emendada desde os tempos de Sólon até os alexandrinos". No caso de Píndaro, continua Grafton, "a obra subsistente foi apenas uma seleção dos originais, feita não pelo poeta ou na época em que viveu, mas pelo erudito alexandrino Aristófanes de Bizâncio, séculos mais tarde. E nem mesmo esse estágio na transmissão do texto de Píndaro poderia ser reconstruído completamente, uma vez que os manuscritos, embora se distribuam em duas classes distintas, mostram, todos eles, erros métricos tão grosseiros que não poderiam provir de Píndaro" (p.83).
3) Grafton, na mesma página, cita um trecho do tratado de Wolf: "O Homero que temos em nossas mãos agora não é o que floresceu nas vozes dos gregos de sua própria época, mas uma versão alterada, interpolada, corrigida e emendada desde os tempos de Sólon até os alexandrinos". No caso de Píndaro, continua Grafton, "a obra subsistente foi apenas uma seleção dos originais, feita não pelo poeta ou na época em que viveu, mas pelo erudito alexandrino Aristófanes de Bizâncio, séculos mais tarde. E nem mesmo esse estágio na transmissão do texto de Píndaro poderia ser reconstruído completamente, uma vez que os manuscritos, embora se distribuam em duas classes distintas, mostram, todos eles, erros métricos tão grosseiros que não poderiam provir de Píndaro" (p.83).
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