terça-feira, 18 de abril de 2023

Hemon, 2



1) No que diz respeito à literatura de Aleksandar Hemon, vale recordar uma frase de Fredric Jameson, tirada de seu livro Raymond Chandler: The Detections of Totality (Verso, 2022, p. 2 - a edição original é de 2016, embora uma versão em francês tenha aparecido em 2014: Raymond Chandler: Les détections de la totalité):

The writer of an adopted language is already a kind of stylist by force of circumstance.

A ideia do indivíduo transformado em um "estilista" por "força das circunstâncias" é bastante pertinente não apenas para o caso de Hemon (embora isso já tenha se transformado em uma sorte de cena inaugural bastante distante no tempo, uma vez que ele já está impressionantemente assimilado ao sistema estadunidense, ensinando em Princeton, escrevendo roteiros para Hollywood), mas também para o caso de Rafael Pinto, o protagonista de The World and All That it Holds.

2) Rafael adota uma menina, Rahela, logo depois do parto, quando a mãe morre; para todos os efeitos, ele é seu pai e o acompanha ao longo da trajetória do exílio, em seus anos de infância e início da adolescência; eles falam a mixture of Bosnian and Spanjol and German, escreve Hemon, with many words they had picked up along the way from Tajik and Kyrgyz and Uighur, and the nameless languages and dialects they had absorbed while following various caravans - they spoke a language that no one in the world spoke other than the two of them, because no one had gone through the things they had (p. 219).

3) Quando Rahela retorna já bem idosa no epílogo que encerra o livro, declara que talvez a língua falada com seu pai tenha sido uma língua única, compreendida apenas por eles (ela tenta repetir a língua com outras pessoas quando retorna a Sarajevo, mas ninguém entende). A cada ponto do percurso a língua vai se transformando, "Bosnian", "Spanjol" e "German" são elementos que Rafael traz consigo da vida prévia e passa adiante para a filha; "Tajik", "Kyrgyz" e "Uighur", no entanto, já pertencem à dimensão do exílio e do trânsito, bem como os "idiomas" e "dialetos" sem "nome" absorvidos com as caravanas (Jacques Derrida em Torres de Babel: "A tradução não buscaria dizer isto ou aquilo, a transportar tal ou tal conteúdo, a comunicar tal carga de sentido, mas a remarcar a afinidade entre as línguas, a exibir sua própria possibilidade" (trad. Junia Barreto, UFMG, 2002, p. 44).   

Nenhum comentário:

Postar um comentário