1) Em seu livro recente, Con voce umana: arte e vita nei corpi di Maria Callas e Ingeborg Bachmann, Laura Boella resgata uma espécie de cena inaugural: o momento no qual Bachmann viu Callas cantar ao vivo pela primeira vez, em janeiro de 1956. Para Boella, esse momento redefine o universo criativo de Bachmann, envolvida em uma tensa passagem da poesia à prosa. Três elementos passam a ser levados em consideração por Bachmann de forma sempre entrelaçada - corpo, voz e presença -, uma sorte de reconfiguração poética alavancada pela "aparição" de Callas.
2) Boella resgata também Thomas Bernhard e o papel de Bachmann em seu romance Extinção. Franz-Josef Murau fala já nas primeiras páginas de uma amiga, Maria, austríaca como ele, de Klagenfurt, a cidade de Bachmann. Apesar da estima recíproca, o narrador mantém um laivo de ambivalência com relação a Maria: ele tem um sonho recorrente no qual a amiga aparece como uma espécie de figura de ópera, recém chegada de Paris para o encontro com Murau, seu aluno Gambetti, o filósofo Zacchi e o rabino Eisenberg. Maria chega por último, extravagante e luminosa, rompendo a harmonia do grupo.
3) O fato o objetivo do encontro do grupo (dentro do sonho de Murau) seja o de discutir a relação entre a poesia de Maria e a filosofia é um claro aceno "a um dos tantos clichês aplicados à obra" de Bachmann, escreve Boella, "a propósito da qual as pesquisas sobre a influência de Wittgenstein ou de Heidegger frequentemente tomou o lugar de uma leitura atenta de seus escritos". Boella também identifica, em filigrana, certa incompreensão da parte de Bernhard acerca da passagem de Bachmann da poesia para a prosa (ela projetava um "grande afresco da modernidade", seguindo o "modelo de Balzac, de Proust, de Musil").
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