O formalismo literário também não foi definido politicamente, isto é, não foi definido de modo algum. O bom Lukács filia-o simploriamente à decadência. A vanguarda literária é formada por burgueses decadentes, e fim de papo. O que se deve fazer é ignorá-los e ler os clássicos. Em parte nenhuma ele se ocupa dos formalismos das democracias e do Estado fascista. (Aumento da produção... dos meios de destruição, liquidação da luta de classes, em lugar da liquidação das classes etc.) O declínio da narrativa é visto como puro declínio. A montage é vista como um traço característico da decadência. Porque a unidade é rompida por ela, e o todo orgânico morre. Naturalmente se podia fazer também um estudo concreto da montage. (No filme Zuiderzee, de Ivens, que mostra a recuperação da terra fértil e a destruição paralela dos frutos da terra em outros lugares.)
O outro pecado é o monólogo interior. Ninguém nunca examinou isto ou expôs seus defeitos reais (podia-se pegar o da mulher em Ulisses e o de Hitler que consta do Discurso em Coragem de Heinrich Mann). Não o teríamos então extirpado por completo como um estratagema artístico, mas presumivelmente teríamos mostrado suas imperfeições em condições concretas. Pois, é claro, como pura empatia isto deve ter gigantesco potencial de erro. Existe sem dúvida uma coisa como um movimento vazio e autógeno da forma, uma satisfação puramente formal de necessidades reais, uma violação dos fatos pelo tratamento generalizador etc.
Mas pode-se também tratar questões formais formalisticamente, e isto é o que acontece no caso do destemido Lukács. Segundo esses marxistas as coisas estão neste pé: os realistas burgueses praticavam um realismo imperfeito, ainda tinham idola; tratemos de esquecê-los e tudo ficará em ordem. Seus fatos são aceitos e rearranjados. Marx não está mais equipado com as conclusões corretas do que Ricardo. Cholokhov é Balzac, depois de retirados os antolhos. Na realidade esses Cholokhovs não tem sequer um grama do materialismo de Balzac (uma notável infusão de romantismo, predileção pelos fatos, mania de colecionador, especulação etc) e tem inumeravelmente mais pontos cegos. A recomendação de estudar os realistas burgueses é totalmente formalista, já que não está ligada a nenhuma crítica conscienciosa da obra deles.
(Bertolt Brecht, Diário de trabalho: Volume I, 1938-1941. Trad. Reinaldo Guarany e José Laurenio de Melo. Rio de Janeiro: Rocco, 2002, p. 25-26).
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