Aos quatorze anos eu estudava em um
internato no Appenzell. Um lugar no
qual Robert Walser havia feito muitas caminhadas quando estava no
manicômio, em Herisau, não muito longe do nosso instittuto. Morreu na
neve. Fotografias mostram suas pegadas e a posição do corpo na neve. Nós
não conhecíamos o escritor. Nem mesmo nossa professora de literatura o
conhecia. Às vezes penso como seria bonito morrer assim, depois de um
passeio, deixar-se cair num sepulcro natural, na neve do Appenzell,
depois de quase trinta anos de manicômio, em Herisau. É realmente uma
pena que não soubéssemos da existência de Walser, teríamos levado uma
flor para ele.
Fleur Jaeggy. I beati anni del castigo.
Milano: Adelphi, 1989, p. 9
*
A primeira vez que li o nome "Fleur Jaeggy" foi em Doctor Pasavento, o romance de Vila-Matas. Escrevendo em espanhol, Vila-Matas cita o título do livro em francês, Les années bienheureuses du châtiment - um livro escrito originalmente em italiano, publicado em 1989. Grande parte do fascínio de Doctor Pasavento
está em sua maníaca perseguição a Robert Walser, e tudo que Vila-Matas
fala sobre o livro de Jaeggy é que se passa rigorosamente no mesmo lugar
em que Walser viveu suas últimas décadas de vida. Primeiro pensei que
fosse um livro inventado por Vila-Matas, como tantos outros. Quando
verifiquei a autenticidade de Fleur Jaeggy e I beati anni del castigo,
passei a imaginar como seria uma narrativa que toma como ponto de
partida a geografia crepuscular de Robert Walser. Depois de finalmente
ler o livro, descubro que esse caráter parasitário é apenas a superfície
- o cerne é muito maior, feito de angústia, vazio e um silencioso
desespero diante daquilo que poderíamos chamar, no sentido que dava
Gombrowicz a essa palavra, de maturidade.
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