Para Sebald, interesses pessoais e profissionais o encaminhavam à Áustria (foco de atenção também do autor que mais impacto teve sobre Sebald, Thomas Bernhard). Trata-se de uma "tradição literária que muito me interessa", ele escreve no prólogo de Pátria apátrida, mencionando que, cinco anos antes (em 1985, portanto), havia publicado outro conjunto de ensaios, Die Beschreibung des Unglücks (a descrição da infelicidade), no qual "ocupavam o primeiro plano as determinantes psíquicas da escrita". Agora, escreve Sebald sobre Pátria apátrida, "trata-se antes das condicionantes sociais de uma visão literária do mundo". Quando escreve sobre Jean Améry, resume muito daquilo que o interessa no contexto austríaco: "Para Améry, não foi a entrada das tropas de Hitler o que destruiu a sua pátria, mas a solicitude com que o país se abriu à invasão: já deviam ter as bandeiras preparadas há muito tempo".
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"Outro dia desses falei com Jean Wahl, justo quando voltava de um encontro com Bergson. Este já vê os chineses às portas de Paris - e isso enquanto os japoneses ainda levavam a melhor na guerra. Wahl também me disse que, segundo Bergson, as estradas de ferro eram culpadas de tudo. (Outra questão é saber o que se poderá arrancar de Jean Wahl quando estiver com oitenta anos) Grete de Francesco passou por Paris. Falei com ela só por telefone. Está assustadoramente abatida. Os pais dela caíram na armadilha austríaca junto com um considerável patrimônio" (Carta de Walter Benjamin a Theodor Adorno, de Paris, em 16 de abril de 1938 - Correspondência, 1928-1940. Trad. José Marcos Macedo. Editora UNESP, 2012, p. 358).
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Em me lembro, disse Vera, disse Austerlitz, de um desses mascates, um tal de Saly Bleyberg, que nos contou as histórias mais aterradoras sobre o comportamento infame dos vienenses: os métodos com que o obrigaram a transferir o seu negócio a um certo senhor Haselberger, o modo como foi trapaceado no preço da venda, que de toda forma já era ridículo, como se viu privado da sua conta bancária e dos seus títulos, como todos os seus móveis e o seu carro Steyr foram confiscados e, finalmente, como ele, Saly Bleyberg e os seus, sentados sobre as malas no pátio de casa, foram obrigados a ouvir o zelador bêbado negociando com o jovem casal, obviamente recém-casado, que viera dar uma olhada no apartamento agora vago. (Austerlitz, trad. José Marcos Macedo, Cia das Letras, 2008, p. 169).
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