2) Em certo sentido, é o que acontece com Sebald, com suas frases longas e o ar nostálgico que consegue inscrever em suas narrativas - decorrência de sua convivência de décadas com as ficções e os estilos de Goethe (1749-1832), Jean Paul (1763-1825), Heinrich von Kleist (1777-1811), Adalbert Stifter (1805-1868), Gottfried Keller (1819-1890)... Esses modos parcialmente estrangeiros de lidar com o literário são utilizados e reconfigurados por Sebald em sua própria obra, que é também atravessada pelas modulações de experiência de sua época (a "conspiração do silêncio" nas décadas de 1950 e 1960; a tensão política característica dos anos 1970; o depauperamento econômico neoliberal dos anos 1980; a xenofobia e o colapso das identidades nos anos 1990).
3) O problema é que o uso que Sebald faz do passado é estratificado e tridimensional, acessando variados pontos simultaneamente, como uma espécie de acorde - é o que acontece desde o começo, desde o primeiro romance, Vertigem, que monta um acorde complexo com Stendhal, Kafka, Goethe e Leonardo Sciascia, todos eles acessados e amalgamados a partir de uma especulação ficcional que tem como ponto focal uma consciência narrativa fortemente identificada (ainda que ironicamente, ainda que em profunda e consistente dúvida de si própria) com o próprio W. G. Sebald (que se reconhece, de resto, como ponto de convergência daquelas poéticas que forma o acorde proposto pelo romance).

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