"O espírito da senhora Genlis", conto publicado por Nikolai Leskov em 1882, tem como epígrafe uma frase de Antoine Augustin Calmet: "Às vezes, é mais fácil invocar um espírito do que livrar-se dele", bastante adequado ao tom irônico da narrativa (que tem como subtítulo: "um caso espírita"). O narrador informa que a história se passa em um inverno da década de 1860, auge da febre das mesas girantes e fenômenos assemelhados.
(neste ponto é possível relembrar a citação de Kittler acerca da relação de Balzac e Poe com a fotografia, que passava por uma renovação da curiosidade pelo sobrenatural: "Balzac, com suas tendências místicas, só conseguia imaginar o ser humano como um ser que consiste em muitas camadas ópticas - como uma cebola -, das quais cada fotografia retira e arquiva a camada superior, descascando-a, portanto, da pessoa fotografada") (mas é possível também relembrar Mesmer, bem como as relações possíveis entre Mesmer, Freud e Charcot)
O elemento que confere excepcionalidade ao conto de Leskov é o fato do espírito da senhora Genlis (uma personalidade histórica: escritora e educadora francesa que nasceu em 1746 e morreu em 1830) se manifestar por meio de seus livros - não de forma metafórica, mas material: o espírito estava nos "livrinhos azuis" que a princesa russa com quem o narrador de Leskov entra em contato mantém em sua estante.
É a princesa quem explica, aliás: Estou convicta de que o delicado fluido de Félicité escolheu para si um lugarzinho aprazível sob o marroquim feliz, que abraça as folhas nas quais adormeceram os seus pensamentos, e, se o senhor não é totalmente descrente, então espero que consiga entender isso.
(Leskov, Um pequeno engano e outras histórias, trad. Noé Polli, Ed. 34, 2024, p. 9)
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