1) No último capítulo de Mimesis, dedicado a uma análise da "meia marrom" em Virginia Woolf (uma passagem do romance Ao farol), Auerbach fala não apenas de Woolf, Joyce e Proust, mas da cena modernista de uma forma geral - chega a comentar, por exemplo, que existem certos romancistas que, apesar de já esteticamente "prontos" (ou "maduros"), utilizam ad hoc algumas das técnicas vanguardistas (o principal exemplo de Auerbach é Thomas Mann). Trata-se, contudo, de um capítulo de despedida e, por isso, complexo e heterogêneo - Auerbach chega a fazer um paralelo com Homero, retomando a cena do reconhecimento de Ulisses por conta de sua cicatriz (Auerbach, portanto, liga o ponto final ao ponto inicial de seu projeto).
2) O paralelo com Ulisses pode ser produtivo, na medida em que Auerbach, exilado e irrequieto (além de cosmopolita e poliglota), tomava como próprio o destino do errante. Ulisses, ao voltar para casa, antes de voltar ao leito que ele próprio construiu (a partir da árvore que nasce no lugar onde está o quarto), conta a Penélope como aprendeu, pelas palavras de Tirésias no inferno, que ele precisa - mesmo depois do retorno - seguir viagem. Ao retomar o início de Mimesis no final de Mimesis, Auerbach mostra, de forma enviesada, que o trabalho deve continuar, que o "final" é apenas um "começo" deslocado (Ulisses precisa seguir viagem já no dia seguinte, depois da noite de amor com a esposa, até encontrar alguém que não reconheça o remo - que deve, necessariamente, levar consigo - como um remo, e sim como uma "pá para grãos").
3) Tanto é verdade que o fim de Mimesis marca um recomeço que Auerbach define o próprio trabalho como uma filologia feita a partir dos moldes vanguardistas (e justamente porque Auerbach não sabe a direção do romance contemporâneo, também não sabe a direção exata de seu próprio trabalho). Em outras palavras, ele afirma que seu trabalho não é totalizante ou histórico, e sim a investigação de certos detalhes, certas cenas e certos problemas - algo que, de resto, é exemplificado e evidenciado pelo próprio drama da "meia marrom" de Virginia Woolf, na qual Auerbach vê o próprio destino (analisar toda uma existência condensada em uma cena, um detalhe: a cicatriz, a meia marrom, o carneiro de Dindenault na análise de Rabelais, etc).
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