quarta-feira, 15 de junho de 2022

Fantasmas da minha vida


1) Em ensaio dedicado a Ernesto de Martino (publicado em seu livro La lettera uccide, Adelphi, 2021), Carlo Ginzburg aproxima as pesquisas do antropólogo italiano àquelas de Aby Warburg, especialmente no que diz respeito à relação entre "esquizofrenia" e "magia". Ginzburg cita um trecho de um ensaio de Giorgio Pasquali sobre Warburg, publicado em 1930, um ano após a morte do autor de O ritual da serpente: "A doença foi, em certo sentido, a continuação de sua pesquisa científica", escreve Pasquali sobre Warburg, cita Ginzburg, e continua: "Warburg nunca parou de observar a si próprio, e de descobrir em si próprio o homem primitivo que, em sua magia, encontra sua lógica" (p. 207).

2) Observar em si próprio a "doença", a ciência e o percurso que costura uma coisa na outra: uma estratégia de trabalho que condensa subjetividade e coletividade, um arco que leva da Interpretação dos sonhos de Freud (publicado em novembro de 1899, mas com data de 1900) ao livro de Mark Fisher, Ghosts of my life: writings on depression, hauntology and lost futures, de 2014 (disponível no Brasil pela editora Autonomia Literária, traduzido como Fantasmas da minha vida: escritos sobre depressão, assombrologia e futuros perdidos), passando por livros como Minima Moralia, de Adorno, Tristes trópicos, de Lévi-Strauss, Fragmentos de um discurso amoroso, de Barthes, Diario de la hepatitis, de César Aira, e assim por diante.

3) Ginzburg acrescenta ainda que um livro foi decisivo para as ideias de Ernesto de Martino sobre as relações entre esquizofrenia e magia: Das Archaisch-Primitive Erleben und Denken der Schizophrenen, publicado por Alfred Storch em 1922. O livro consta na Biblioteca Warburg, embora não exista indício de que tenha sido lido por Warburg. Ginzburg levanta a hipótese de que Warburg possa ter lido o livro de Storch durante seu internamento na clínica de Ludwig Binswanger (onde apresentou a conferência sobre o ritual da serpente em 21 de abril de 1923), uma vez que Storch e Binswanger se conheciam e trabalhavam no mesmo campo (Ginzburg acrescenta ainda que a correspondência entre Storch e Binswanger é vasta).   

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