sexta-feira, 22 de janeiro de 2021

O problema da verdade


1) Em seu ensaio "Historical Emplotment and the Problem of Truth" (apresentado primeiro no evento de Saul Friedlander de 1990, "Probing the Limits of Representation" (lançado em livro em 1992), e agora disponível na coletânea Figural Realism), Hayden White mais uma vez retoma a questão das relações possíveis entre “história” e “narração”, com ênfase na representação (possível ou impossível? Disponível ou interditada?) da Shoah. White ataca uma “nova” questão usando ferramentas que vinha aprimorando em seus textos dos anos anteriores, com destaque para seu resgate da “intransitividade” e da “voz média” tal como teorizadas por Roland Barthes.

2) Em determinado ponto do ensaio, White comenta o esforço de Andreas Hillgruber (recém-falecido em 1989, aliás) de "salvar" parte do legado alemão da II Guerra Mundial, separando a resistência "trágica" do Exército alemão no fronte ocidental no inverno de 1944-1945 (a premissa central de seu livro Zweierlei Untergang, "Dois tipos de queda"). A "tragédia" da resistência, escreve White, é a forma de enredo que Hillgruber encontrou para conferir "heroísmo" a uma parte específica do legado nazista (com isso White enfatiza a validade de sua posição: a "história" não existe além ou aquém da estratégia narrativa que lhe confere forma).

3) Essa tentativa de deslocamento de enredo no interior do nazismo evoca o romance de Paul West, The Very Rich Hours of Count von Stauffenberg, publicado em 1980. Minha lembrança do romance de West não é direta, ele é evocado a partir do uso que dele faz J. M. Coetzee em um dos capítulos do romance Elizabeth Costello (de 2003). Costello se refere ao romance de West dentro do romance de Coetzee, afirmando que, dada sua representação da violência (West retrata com riqueza de detalhes as torturas sofridas pelos oficiais nazistas que tentaram matar Hitler em um atentado), algo assim nunca deveria ter sido escrito (o “heroísmo”, de certa forma, também é mobilizado por West no interior do nazista, sob o signo da resistência aristocrática).

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