1) O jogo da crítica é aquele de justapor peças, lançando aqui e ali contatos possíveis, sempre arbitrários, na esperança de que algum desenho (coerente, incoerente, figurativo ou cubista) possa surgir, um mapa que facilite (ou dificulte) o acesso a um texto já conhecido. No caso de Joyce, por exemplo, do Ulysses de Joyce, as referências acessíveis formam um percurso quase automático: Homero, Vico, Flaubert (e Beckett como um continuador).
2) O que acontece, por exemplo, na passagem de Balzac a Joyce? São projetos análogos em seus desejos de totalidade e exaustividade: mas aquilo que Balzac faz em 91 obras (finalizadas; outras 46 ficaram incompletas - algumas apenas na fase do título), Joyce condensa em uma (ou duas, se contarmos o Finnegans Wake). Ulysses conta tantas histórias e tem tanta ambição de mergulhar em seus personagens quanto a Comédia humana de Balzac, mas o procedimento é radicalmente diverso - mais a condensação enigmática do que a extensividade pedagógica.
3) Diante da Comédia humana e de Ulysses, o leitor é igualmente convidado a gastar uma enorme quantidade de tempo na decifração. No caso de Balzac, é um tempo a princípio linear, extensivo, cumulativo, que se percebe na sucessão das obras (imagine 91 livros sobre uma mesa de trabalho dedicada exclusivamente a Balzac); no caso de Joyce, trata-se de um tempo mais amorfo e irregular, uma leitura que convida à decifração de palavra por palavra, frase por frase. No primeiro, a energia é difusa; no segundo, é concentrada.
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