sexta-feira, 5 de maio de 2017

Benefícios e malefícios de Jorge Luis Borges

Quando descobri Borges, em 1945, não o entendia e na verdade me chocou. Procurando Kafka, encontrei seu prólogo a A metamorfose e pela primeira vez enfrentei seu mundo de labirintos metafísicos, de infinitos, de eternidades, de trivialidades trágicas. Um novo universo, deslumbrante e ferozmente atrativo. Passar daquele prólogo para tudo que viria de Borges constituiu para mim (e para tantos outros) algo tão necessário como respirar, ao mesmo tempo que tão perigoso quanto se aproximar de um abismo mais do que seria prudente.

(...)

E por último, o grande problema: a tentação de imitá-lo era quase irresistível; imitá-lo, inútil. Qualquer um pode se permitir imitar impunemente Conrad, Greene, Durrell; não Joyce, não Borges. Resulta muito fácil e muito evidente.

O encontro com Borges não acontece nunca sem consequências. Aqui estão algumas das coisas que podem acontecer, entre benéficas e maléficas:

1. Passar a seu lado sem se dar conta (maléfica).
2. Passar a seu lado, voltar e segui-lo durante um bom trecho para ver o que faz (benéfica).
3. Passar a seu lado, voltar e segui-lo para sempre (maléfica).
4. Descobrir que se é idiota e que até esse momento não lhe ocorreu nenhuma ideia que mais ou menos valesse a pena (benéfica).
5. Descobrir que se é inteligente, uma vez que gosta de Borges (benéfica).
6. Deslumbrar-se com a fábula de Aquiles e da tartaruga e acreditar que é isso mesmo (maléfica).
7. Descobrir o infinito e a eternidade (benéfica).
8. Preocupar-se com o infinito e a eternidade (benéfica).
9. Crer no infinito e na eternidade (maléfica).
10. Deixar de escrever (benéfica).



(Augusto Monterroso, Movimiento perpetuo. Barcelona: Anagrama, 1990, p. 53-58).

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