1) Javier Marías é um escritor diabolicamente habilidoso na construção de suas tramas, especialmente no que diz respeito às repetições, ecos e detalhes que formam a tessitura de base de seus romances. Para que esse trabalho minucioso seja ainda mais ressaltado, Marías costuma produzir obras de grande porte – Os enamoramentos, por exemplo, tem 400 páginas. Trata-se de um procedimento deliberado – Marías amplia suas frases ao máximo, encadeando reflexões, especulações e suposições, frequentemente sustentando suas histórias sobre o tênue terreno da dúvida e da suspeita.
2) Sua ficção não é fragmentária ou lacunar, do tipo que oferece múltiplos pontos de vista sem completar qualquer um deles; pelo contrário, a narrativa de Marías é volumosa, persegue uma perspectiva até a exaustão, numa espécie de totalitarismo da observação – e isso decorre diretamente do cruzamento de duas de suas principais referências, Marcel Proust e Laurence Sterne.
3) Além do trabalho com a linguagem – os períodos longos, a tensão inerente às digressões da voz narrativa –, Marías investe fortemente no efeito estético das repetições: cenas que retornam, palavras idênticas em contextos variados, imagens recorrentes. Em Os enamoramentos, a cena de um homem sendo esfaqueado em plena rua é um exemplo desse esforço: retorna frequentemente durante a narrativa, resgatada a partir dos mais variados aspectos - a agonia da morte, a violência das estocadas, o que pensava o assassino, o que pensava a vítima, a natureza da faca, descrições e reflexões sobre o local da tragédia (a rua, o clima, a vizinhança).
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P.S: Essas ideias são desenvolvidas num longo texto que saiu na Revista ArtFliporto.
Pra variar mais um belo texto, Kelvin. Mas o link não leva ao desenvolvimento das ideias. Como faz para vê-las?
ResponderExcluirBeijo,
Ju.
Oi, Ju
ExcluirObrigado, fico feliz que vc tenha gostado.
Pois é, o conteúdo da revista ainda não tá disponível online... Acho que em breve coloco o texto completo aqui no blog.
bj
Aguardarei ansiosa.
ResponderExcluirBeijos (: