"Lembro-me da noite inaugural, no Collège de France, para a primeira aula de Roland Barthes. Depois da sessão, havia uma festa alegre na casa de seu amigo marroquino. Foi uma das raras vezes em que veria Roland feliz e descontraído, livre da competição que lhe pesava como uma montanha. Os convidados eram na maioria seus jovens discípulos, com algumas raras moças, mas se encontram ali também cinco ou seis antigos companheiros: Genette, Foucault, Deleuze e eu mesmo. Depois de abundantes libações, a atmosfera tornando-se mais terna e acariciante, digo a Barthes que estava na minha hora de partir, dadas as minhas preferências bastante restritas nesse campo.
Michel Foucault, que não bebia jamais uma gota de álcool e tornava-se, com a idade, cada vez mais intolerante em relação aos heterossexuais, adotando seu ar de aiatolá, guardião da lei divina, lança-me bem alto: 'Eu te disse e repito, Alain: sexualmente, tu vives e sempre viveste no erro!'. Claro, havia sarcasmo no brilho dos seus olhos de filósofo passional, mas a condenação parecia contudo tão evidente que Roland, encarnação da tolerância, sobretudo naquela noite, protege-me do juiz, passando o braço em torno dos meus ombros, e propõe em minha defesa: 'Apesar de tudo, é um perverso...' - 'Isso não basta!', decide Foucault com violência"
(Alain Robbe-Grillet, Os últimos dias de Corinto, trad. Juremir Machado da Silva, Sulina, 1997, p. 207-208)
