sábado, 8 de fevereiro de 2025

O irracional


"A prova mais surpreendente da reação contra o Iluminismo [grego] encontra-se nos processos bem-sucedidos movidos contra intelectuais, a propósito de questões de natureza religiosa, ocorridos em Atenas no último terço do século V a.C. Em torno de 432 a.C., a descrença no elemento sobrenatural e o ensino da astronomia tornaram-se ofensas passíveis de punição.  

Os trinta e tantos anos que se seguiram testemunharam uma série de processos de heresia; algo único na história de Atenas. As vítimas incluíam a maior parte dos líderes do pensamento progressista: Anaxágoras, Diágoras, Sócrates, quase com certeza Protágoras e talvez Eurípides. Em todos os casos, com exceção do último, a ação judicial teve sucesso: Anaxágoras pode ter sido multado e banido; Diágoras escapou em tempo; Protágoras ao que parece também; Sócrates, que poderia ter feito o mesmo ou pedido uma sentença de expulsão da cidade, escolheu ficar e beber a cicuta. 

Todos eles eram pessoas famosas. Quantos cidadãos obscuros podem ter sofrido por suas opiniões é algo que não sabemos. Mas o que possuímos basta para provar que a grande idade do Iluminismo grego foi também, como nossos próprios tempos [Dodds escreve em 1949], uma idade de perseguição  -  com estudiosos sendo banidos, obscurecimento do pensamento e até mesmo (se acreditarmos na tradição a respeito de Protágoras) queima de livros"

E. R. Dodds. Os gregos e o irracional. Trad. Pedro Oneto, Escuta, 2002, p. 191. (é uma pena que um livro tão bom esteja acessível no Brasil em uma edição tão ruim: a tradução está cheia de erros, vários nomes gregos não foram traduzidos, vários títulos e termos estrangeiros estão sem itálico, várias vírgulas completamente equivocadas, vários plurais sem o "s", e o mais sério: várias vezes o período "d.C." é trocado por "a.C.", tornando a coisa toda muitíssimo confusa)

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