1) O aspecto mais interessante da fábula de Luciano de Samósata sobre seu encontro com Homero - que acontece em seu romance Das narrativas verdadeiras, paródia satírica e irônica dos textos fantásticos do passado e de crendices variadas - é a origem "estrangeira" que ele confere ao poeta. O encontro acontece na "Ilha dos Beatos", onde estão também Pitágoras, Ulisses, Sócrates, entre outros.
2) Essa diluição da solenidade da origem é muito interessante: Luciano resgata no além o poeta original por excelência, o Homero que serve de exemplo e de repositório de sabedoria para tantos autores das mais variadas estirpes, ressaltando, contudo, que ele não era grego, e sim um bárbaro: só depois de ter se tornado refém dos gregos, ou seja, escravo de guerra, ele muda de nome e assim por diante (todo o movimento de Luciano é já uma paródia do mergulho nos mundo ínferos em busca de revelações e descobertas, como a katabasis do Canto XI da Odisseia, ou o Canto VI da Eneida de Virgílio).
3) Será que a reconstrução irônica que faz Luciano das origens de Homero tem alguma relação com seu primeiro tradutor para o latim, Lívio Andrônico? Nascido por volta de 284 a.C., na cidade que hoje é Tarento, Andrônico foi levado prisioneiro quando os romanos invadem a cidade em 272; vai como escravo para Roma e começa a trabalhar para a família Lívia como professor dos filhos de seu senhor. Foi nessa condição pedagógica que percebeu a falta de material adequado para o exercício do ofício - diante disso, por volta de 240, decide traduzir a Odisseia, de Homero, para o latim.
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