"Peter Sloterdijk afirmou recentemente que, para compreender esse aspecto [a capacidade de automodelagem do sujeito] - situado na estreita margem ao longo da qual o humanismo vai além de si mesmo -, é preciso abandonar o lugar extático ao qual nos conduziu Heidegger. Ou, ao menos, atravessá-lo em uma direção diversa daquela, hiper-humanística, no fim das contas, que ele tomou para defender a absolutez ontológica do Dasein. Para fazer isso, é preciso violar um duplo interdito, imposto pelo próprio Heidegger, relativo à antropologia e à técnica, em favor do absoluto primado da linguagem.
Uma vez que é justamente a antropotécnica - e não a faculdade linguística - o vetor de sentido mais extremo que, em uma vertiginosa transposição semântica, liga o vocabulário ainda não moderno da Oratio ao nosso destino de animais pós-modernos. E isso não porque a linguagem não faça parte dos instrumentos que o homem deu a si mesmo a fim de alcançar a própria condição essencial, mas porque ela não foi o primeiro nem o principal entre eles. Antes que pela linguagem, embora não independentemente dela, o homo humanus, ou sapiens, como se queira, forjou-se, de fato, por meio da técnica.
Primeiramente, a técnica pesada do golpear e do lançar, da pedra e do fogo; em seguida, aquela leve, dos gestos e dos símbolos - assim como, antes da linguagem, teve de habitar outra casa, outro invólucro antrópico, capaz de abrigá-lo das potências predominantes"
(Roberto Esposito, Pensamento vivo: origem e atualidade da filosofia italiana, trad. Henrique Burigo, Ed. UFMG, 2013, p. 55)
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