sexta-feira, 8 de março de 2019

Ensaio, forma, tempo

Comentando o texto de Adorno, "O ensaio como forma", Georges Didi-Huberman destaca a frase: a atualidade do ensaio é a de um anacronismo. Trata-se, no ensaio, de abolir o conceito tradicional de método, operar menos pela sucessão e pela acumulação e mais pela associação, pelos saltos (a velha ideia dos formalistas russos da tradição que passa não de pai para filho, mas de tio para sobrinho). 

Trata-se de um "método impuro", comenta Didi-Huberman, que opera "por contiguidades, contaminações, deslocamentos, movimentos de absorção", "mais dialético do que a dialética": "Da mesma forma que pensadores não acadêmicos (Bataille ou Benjamin), escritores ou artistas (Brecht ou Raoul Hausmann) se apropriaram da palavra dialética com essa alegria devorante que solicitava, segundo uma célebre fórmula de Georges Bataille, tanto o sistema quanto o excesso".

"Ensaiar é tentar novamente", continua Didi-Huberman. Ou seja, trata-se de sempre recomeçar, insistindo na releitura, experimentando "outras vias, outras correspondências, outras montagens. O ensaio como gesto de sempre retomar tudo. Isso me relembra", continua Didi-Huberman, "o modo como Aby Warburg concluiu uma de suas célebres conferências (Florença, 1927): 'Continuemos - coragem! - recomecemos a leitura!' (si continua -coraggio! - ricominciamo la lettura!). Todo ensaio que se respeite pressupõe isto: não haverá última palavra. Será preciso desmontar tudo novamente, remontar tudo" (Georges Didi-Huberman, Remontagens do tempo sofrido, trad. Márcia Arbex e Vera Casa Nova, UFMG, 2018, p. 113-114).  

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