1) Em uma das notas reunidas em seu livro Nero su nero, Leonardo Sciascia conta uma história siciliana da II Guerra Mundial: em uma pequena cidade na região de Agrigento chega a notícia da morte em batalha, na África, de um jovem morador do local. As autoridades decidem homenageá-lo de forma solene - era a primeira baixa registrada, tanto da cidade quanto da província -, com missa fúnebre, parada militar e discursos dos dignitários.
2) A mãe do falecido, contudo, continuava ouvindo a Rádio Londres - o que era rigorosamente proibido por lei na Itália da época -, que todos os dias anunciava os nomes dos soldados italianos feitos prisioneiros: teve a alegria de escutar não apenas o nome, mas também o sobrenome, local de nascimento, classe e matrícula. Não havia possibilidade de erro, era ele mesmo. Com a alegria, no entanto, veio a preocupação: a mãe não podia impedir o funeral sem confessar que havia escutado as transmissões radiofônicas do inimigo.
3) Sciascia escreve que a mulher experimentou o confronto do "medo supersticioso do funeral" (que poderia gerar "influxos de mau-agouro" em direção ao filho) com o "medo concreto de ser presa". Depois de passar a noite em claro pensando, acreditou ter encontrado a solução: foi ao chefe de polícia e disse a ele que tinha sonhado com seu filho, e que ele havia dito que o funeral não devia ser feito, ele estava vivo e bem em um campo inglês de prisioneiros. O chefe escutou com atenção e paciência e disse (escreve Sciascia): "Tia Carmela, esta noite tive o mesmo sonho, exatamente o mesmo... Mas o funeral precisa ser feito". "E foi feito", completa Sciascia.