quinta-feira, 30 de maio de 2024

Amizade e segredo


1) Na tarde do dia 10 de novembro de 2001, um sábado, Jacques Derrida participou de um evento chamado "Vida depois da teoria", na Universidade de Loughborough, na Inglaterra. Na manhã daquele mesmo dia, ele havia dado uma conferência intitulada "Perjúrios", na qual falou, entre outras coisas, de Paul de Man. À tarde, ele responde perguntas; uma das perguntas diz respeito à amizade que Derrida dedica a De Man: "ele ainda é meu amigo", diz Derrida, "ele está morto, mas é através da morte, ou depois da morte, que a amizade, o teste da amizade, é demanded". É preciso decidir se a fidelidade é mantida quando a pessoa não está mais presente para "verificar ou responder", diz ainda Derrida (life.after.theory, ed. Michael Payne e John Schad, Continuum, 2003, p. 28).

2) Em seguida, Derrida começa pouco a pouco a aproximar Paul de Man da categoria de unheimlich, ou seja, de "estranho" ou "inquietante" (já que a palavra indica, simultaneamente, aquilo que é caseiro/familiar [heim] com aquilo que nega essa proximidade [un]). Paul de Man é, simultaneamente, o amigo e o estranho, o familiar e o inquietante (porque mentiu, ocultou, ao mesmo tempo em que foi aberto e sincero): "ele permaneceu um segredo para mim", diz Derrida (p. 34). 

3) Derrida diz ainda que tenta ler o das Unheimliche não apenas em Freud - a referência mais frequente quando se fala em estranho/inquietante -, mas também em Heidegger: em sua obra, diz Derrida, o termo é "muito presente" e em lugares where the stakes are very high. Derrida não entra em detalhes, mas diz que em seus seminários tenta rastrear os momentos em que Heidegger usa o termo, e são sempre the most decisive moments (os organizadores da coletânea insistem, no prefácio, que Derrida respondeu as perguntas sempre em inglês). O fato de Heidegger e Freud utilizarem o mesmo termo, diz Derrida, é significativo: é o "melhor conceito" para aquilo que resiste à "consistência" e à "identidade semântica".

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