O que é o "ruído branco" para Don DeLillo, para além do sentido imediato ligado às emissões fora de sintonia, aleatórias e com intensidade equilibrada em diferentes frequências? Seu estilo detalhista, seu apego crítico à tecnologia, seus personagens por vezes inusitados, excêntricos, falam de um mundo que oscila entre a hiper-conexão irrestrita (o consumismo como ontologia) e uma inércia subjacente, uma sorte de sonambulismo quimicamente induzido (faz sentido pensar em Hermann Broch e na trilogia dos sonâmbulos (1930, 1931, 1932): os mundos de DeLillo e Broch são semelhantes na embriaguez de tecnologia da guerra e na incerteza histérica da passagem de mãos das "potências mundiais").
A questão de DeLillo é também uma questão heideggeriana na medida em que tenta elaborar cenários possíveis a partir da relação entre o Ser e a técnica e a expansão desse atravessamento no próprio tecido do tempo (Submundo é a arqueologia pluridimensional de um artefato - a bola de beisebol - capturado nessa trama; A artista do corpo faz da materialidade do ente o próprio artefato). A reflexão sobre a "atmosfera" (central não só para Heidegger, mas também e especialmente para Peter Sloterdijk) é determinante em Ruído branco: "Após uma noite de neve onírica, o céu ficou limpo e tranquilo. Havia uma tensão azulada na luz de janeiro, uma dureza, uma confiança. O ruído de botas pisando neve compacta, os riscos nítidos deixados pelos jatos no azul. O tempo era um dado muito relevante, embora de início eu não o soubesse" (Ruído branco, trad. Paulo Henriques Britto, Cia das Letras, 1987, p. 107).
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