1) Sou levado a pensar sobre o espaço físico ocupado pela escritura, ou seja, o pedaço de papel. Vila-Matas, em Doctor Pasavento, experimenta mini-ensaios, tendo como base os microgramas de Robert Walser - os 526 pedaços de papel, preenchidos com uma escrita microscópica, encontrados no sanatório onde ele ficou até morrer no dia de Natal de 1956. A plataforma influencia diretamente sobre aquilo que é escrito, por conta de seu espaço controlado: contigência e expressão.
2) Mínimos, múltiplos, comuns (João Gilberto Noll) funciona assim. As fichas de Barthes, sempre idênticas, sempre pautadas, preenchidas só em uma face (reunidas em caixas e caixas). O poeta de Pale Fire, de Nabokov, também metódico quanto a quantidade de fichas que abarcariam cada um dos trechos de seu poema. Walser escrevia em folhas de rascunho, notas fiscais, folhetos publicitários. Philip Roth diz: "Procuro escrever ao menos uma página por dia; na pior das hipóteses, tenho 365 páginas escritas em um ano - o que me parece excelente".
3) A quantidade imensa de reflexão e trabalho que se faz necessário para preencher uma única página, mas uma única página perfeita em si, um lampejo que se auto-consome, tanto mais breve quanto mais intensa. A energia criativa que nasce do restolho, do papel irregular para embrulho, do rascunho. Alheio a categorias pretensamente universais (moral, gosto, estética) o pontapé criativo inicial é sempre de ordem particular - irrelevante para essa universalização, portanto, constituindo um desvio e uma negação, que é sempre camuflada, obliterada e silenciada.
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