1) Leio a versão italiana de uma conferência apresentada em 1954 por Gottfried Benn, depois publicada na revista Merkur, intitulada "A velhice como problema para os artistas" (em alemão: Altern als Problem für Künstler; na tradução italiana: Invecchiare come problema per artisti). É o tema do "estilo tardio", que terá uma enunciação pioneira no ensaio de Adorno sobre Beethoven de 1938, passando por Edward Said (seu livro póstumo, Estilo tardio, de 2006, não cita o texto de Benn) e, mais recentemente, por Giorgio Agamben (escrevi um artigo sobre o tema, "O estilo tardio em Giorgio Agamben", disponível aqui).
2) Benn começa costurando referências esparsas vistas recentemente - Lorenzo Lotto, uma obra póstuma de Kant, Hokusai, Hölderlin - até se deter em Goethe, o grande "antepassado", que além de ter envelhecido refletiu sobre o envelhecimento (e sobre todo o resto, parece indicar nas entrelinhas Benn; algo de semelhante se encontra nos comentários de Kundera sobre Goethe (uma "invenção do humano" como aquela que Bloom cria a partir de Shakespeare)). O amor e o desejo parecem gerar um curto-circuito na "sabedoria" do "estilo tardio": "Goethe amou Ulrike aos setenta e cinco anos de idade", escreve Benn, e tinha o firme propósito de se casar com ela, reconfigurando assim as bases de uma rotina sólida e de uma "canonização" em vida.
3) Em seguida ao resgate de Goethe, Benn fala de André Gide e de seus diários, contando rapidamente uma passagem que define como "quase grotesca": aos 72 anos Gide se apaixona, na Tunísia, por um menino de 15 anos; descreve as noites de amor que o fazem lembrar de sua juventude; "quase penoso" é o efeito de uma "observação", continua Benn: na primeira vez que viu o menino, vestido de "serviçal" no hotel, Gide ficou tão tocado pela sua timidez e "ternura" que não conseguiu lhe dirigir a palavra (mesmo aos 72 anos, com tanta experiência, comenta Benn, Gide experimenta uma espécie de "regressão dos instintos", novamente a ideia do "curto-circuito" do estilo tardio).