Wilcock começou a juntar material para seu livro Fatti inquietanti durante a década de 1950. Foi a época que marcou sua saída definitiva de Buenos Aires. Abandonou a Argentina e foi para a Itália, entre muitos outros motivos, porque não simpatizava com o peronismo [especialmente com sua política de recepção de assassinos nazistas depois da II Guerra]. É possível dizer que essa movimentação de nazistas para a Argentina ofereceu a Wilcock algumas boas ideias para sua Sinagoga dos iconoclastas - e, a partir disso, chegamos facilmente à Literatura nazi en América, de Bolaño. De qualquer forma, Fatti inquietanti apareceu bem antes: a primeira edição é de 1960. Barthes ainda passaria por toda uma década estruturalista, toda feita de esquemas e rigidez, antes de conceber a possibilidade de uma literatura pós-autoral, comprometida com um esforço de apagamento [ou de confusão deliberada] das fronteiras entre fonte e citação, transparência e opacidade, arquivo e discurso. Wilcock já manipulava o procedimento em 1958, 1959. Fatti inquietanti é a compilação de uma série de fragmentos esparsos de notícias absurdas veiculadas na imprensa italiana da época. Entre eles, o relato de uma máquina da IBM que contou todas as palavras do Ulisses, separando-as pelo critério da repetição [uma piada que alguns teimosos continuam levando a sério], ou selos eletrônicos dos Correios da Inglaterra, ou ainda pesquisas sobre a relação entre a construção de labirintos e a movimentação do sol. Wilcock recorta alguns momentos de uma massa imensa de informações corriqueiras e realiza uma montagem dinâmica, na qual cada parte dura o tempo necessário para motivar inúmeras perguntas e nenhuma resposta. Não se sabe qual a razão, a função ou a utilidade dessa junção disparatada de dados. Só sabemos que está ali, como um remendo que insiste em descolar; como uma promessa que nunca é cumprida.
A "função" do apanhado é, creio eu, a mesma que a desse propósito considerado passé por alguns, mas que penso ainda interessante, o de fazer História do Presente. Lembra aquele trecho do René Char que o Foucault gostava de citar como definição de seu projeto? Pois é. :-)
ResponderExcluirHistória do Presente é também o "Mitologias", do Barthes (claro, sempre ele, né? nisso concordamos).
ResponderExcluirNão lembro do trecho do René Char, qual é?